Paraíba

ARTIGO

Violência e truculência fez mais uma vítima 

A licença para matar de uma polícia despreparada segue; no futuro chamaremos pelo seu nome: genocídio da população negra

Brasil de Fato | João Pessoa - PB |
Violência e truculência fez mais uma vítima 
Violência e truculência fez mais uma vítima  - Card


Mais de cinquenta seres humanos foram assassinados brutalmente em Altamira, no Pará, enquanto estavam sob a custódia do Estado. Essa semana foram seis mortos em cinco dias em operações policiais no Rio de Janeiro. Entre eles uma mãe de dezessete anos foi morta, alvejada com mais de dez tiros. Ela estava com a filha de dois anos que foi baleada. No último fim de semana a violência do Estado fez mais uma vítima: Eduardo Feliciano Justino, torcedor do Botafogo da Paraíba. Em comum nos três casos: o despreparo do Estado brasileiro em tempos que o próprio presidente repete um discurso de ódio e violência. 
O Botafogo enfrentou o Globo do Rio Grande do Norte no último sábado pela série C do Campeonato Brasileiro, na cidade de Ceará-Mirim. Dentro de campo a equipe pessoense venceu por três a zero, mas fora de campo a humanidade perdeu. Eduardo Feliciano Justino, 27 anos, morreu em decorrência de rompimento do músculo cardíaco ocorrido por lesão praticada com objeto contundente, ou seja, foi brutalmente espancado por policiais sem treinamento adequado para lidar com multidão.   
“Nós chegamos lá eram umas seis horas, faltava uma hora para o jogo. Como o ingresso estava muito caro, sessenta reais, alguns torcedores tentaram pular o muro. Ele, o Eduardo, foi um dos que tentou pular. Ele subiu no muro e depois voltou. Quando voltou tinham uns seis policiais já esperando. Todos os seis com cacetete. Pegaram ele e massacraram bastante”, afirmou André Felipe Borges, presidente da torcida organizada fúria independente, da qual Eduardo também fazia parte”.  
Alguns amigos chegaram a tentar se aproximar de Eduardo que teve as costas marcadas pelo cacetete dos policiais. Segundo relato um dos policiais chegou a sacar a arma e atirar para o chão. Após o fim da confusão e com o corpo já no chão os policiais se negaram a chamar o Samu ou mesmo a fazer o socorro do jovem. “O pessoal pediu para os policias chamarem o Samu ou eles socorrem, mas só faziam rir. Praticamente omissão de socorro. Detalhe: isso antes de começar a partida. Ele só foi socorrido depois que acabou o primeiro tempo.  Um menino jovem que acabou morto por conta desse ato, dessa falta de preparo da polícia”, desabafou André. 
Segundo outra torcedora os policiais foram covardes. “Na hora que cheguei no estádio tudo estava em paz, os membros das Torcidas organizadas estavam juntos, curtindo de boa. Eu estava com meus amigos de frente ao muro do estádio onde tudo aconteceu. De repente vários torcedores pularam o muro do estádio, alguns conseguiram passar, mas teve um que ficou em cima do muro cercado por policiais, era Eduardo. Logo em cima do muro os policiais batiam nas pernas dele com o cassetete para ele descer, quando ele desceu todos os policiais avançaram em cima dela com cassetetes, na covardia”. 
Ainda segundo o relato nem chegou a ter confronto com a polícia. Alguns torcedores da organizada da qual Eduardo fazia parte tentaram fazer os policiais parassem de bater nele. Mas como os policiais revidaram com balas de borracha nem chegou a ter confronto. Segundo o laudo do Hospital Municipal Doutor Percílio Alves, para onde Eduardo chegou a ser socorrido, foram identificadas várias lesões no corpo do torcedor, sendo a morte causado pelo rompimento do músculo cardíaco e a hemorragia em consequência disso.
O clube paraibano também se posicionou oficialmente. Em suas redes sociais divulgou a seguinte nota: “O Botafogo Futebol Clube vem a público lamentar profundamente a morte do torcedor Eduardo Feliciano Justino da Silva, 27 anos, em Ceará-Mirim, Rio Grande do Norte. O clube foi informado que o torcedor foi acompanhar o Belo no estado vizinho e morreu em um hospital de Ceará-Mirim após ser socorrido pelo Samu até a unidade. O Botafogo se solidariza com amigos e familiares à medida em que cobra esclarecimentos das autoridades sobre a morte do torcedor. Atenciosamente, Botafogo F.C”. 
Já a Polícia Militar do Rio Grande do Norte disse que só vai se pronunciar depois da investigação instaurada pela Policia Civil. Nesta segunda o corpo de Eduardo foi enterrado em João Pessoa em meio a gritos de protestos dos torcedores, familiares e amigos. A saudade se misturava ao sentimento de injustiça. Nesse país não importa se são detentos, pais e mães de família ou torcedores. A licença para matar de uma polícia despreparada segue e no futuro chamaremos isso pelo seu nome: genocídio da população negra e periférica.  
*Homero Baco é jornalista
 

Edição: Cida Alves