Os Movimentos sociais e ativistas da causa LGBTQI+ na Paraíba vêm questionando os procedimentos das polícias por omitirem a hipótese de crime homofóbico no caso Gabriel Tassiano.
O superintendente da 1ª Região de Polícia Civil, Luciano Soares, apresentou a versão do assassino na segunda-feira (18). O acusado alega que a motivação foi uma dívida de R$ 500, e também afirmou que mantinha um relacionamento homoafetivo com a vítima. Ele foi autuado em flagrante delito por crime de homicídio triplamente qualificado por motivo fútil, sem defesa da vítima e com uso de requintes de crueldade.
Em junho de 2019 Supremo Tribunal Federal (STF) determinou que a discriminação por orientação sexual e identidade de gênero passe a ser considerada um crime. Pela tese definida na corte, a homofobia também poderá ser utilizada como qualificadora de motivo torpe no caso de homicídios dolosos ocorridos contra homossexuais.
Entrevistamos Eduardo Guimarães, presidente do Movimento do Espírito Lilás (MEL), sobre a omissão de notificação das características de crime homofóbico no assassinato de Gabriel Taciano por seu companheiro.
Brasil de Fato: Por que o assassinato de Gabriel se trata de um crime homofóbico?
Eduardo Guimarães: O corpo tem sinais de uma morte bárbara, com muitas agressões antes da morte. E eles mantinham uma relação já fazia algum tempo, então o crime é extremamente bárbaro, os indícios iniciais são muito claros ao mostrar que se trata de um crime por ódio homofóbico. Então há uma negligência de evidências que apontam imediatamente para um crime bárbaro, a partir de relações homoafetivas.
O que aparenta é que a polícia teve pressa de demonstrar serviço muito rápido por ele ser um militante, e isso é usual nos procedimentos policiais e jurídico brasileiros em relação aos crimes homofóbicos. A homofobia é escondida como razão, e a insinuação, no final das contas, é de que foi um crime por dívida. Então foi minimizada a brutalidade do assassinato, foi alegado motivo fútil.
BdF: A versão contada pelo suspeito alega que a motivação do assassinato foi por dívida. Houve invisibilização da homofobia?
E.G: Infelizmente a versão dada na confissão do cara é a que foi considerada. Mas existe uma relação anterior, uma relação afetiva, e a notícia foi dada de tal modo que a versão dele é a crível. E isso está incorreto; um crime com teores tão bárbaros, precisa ser levantada a hipótese de homofobia.
A caracterização de crimes de gêneros, como o feminicídio por exemplo, são crimes de ódio, não são crimes simples. Gabriel teve o corpo barbarizado, então não se pode pegar um corpo barbarizado e tratar como se fosse um acerto de contas, de dívidas. O cara (suspeito) tem um histórico de violência contra mulher, e acredito que ele deve ser muito mal resolvido em termos de sexualidade e de gênero.
BdF: Os fatos narrados têm muitas lacunas, inclusive sobre a relação afetiva com a vítima. Como o movimento está vendo essa questão?
E.G: A narrativa da história não bate com os indícios. Mas é um inquérito, está sendo levantado, porém os indícios de homofobia foram muito claros para não serem sequer nomeados. E o que a mensagem passada é de que já acharam o cara, já está resolvido, o motivo é aquele, e fim de papo.
E a gente se pergunta, como é que eles chegaram lá? Eles estavam juntos antes? E por que se encontraram naquele lugar (Jacarapé), que não é um lugar de cobrança? E por fim, encontrar um corpo barbarizado; então é um indício de crime de ódio.
BdF: A subnotificação é uma prática comum nos crimes de ódio, racismo, machismo e homofobia?
E.G: Temos o ‘silêncio gritante’ que é quando o não dito, grita. Esta é a forma de invisibilizar e desconsiderar as práticas homofóbicas, inclusive, muitas vezes, invertendo-as, alegando que era uma dívida e que deu uma confusão.
E a gente tem uma grande subnotificação porque há sempre uma descaracterização desses casos. É uma coisa corriqueira. Mas eu acho muito improvável que motivações homofóbicas não estejam dentro e no centro deste caso porque tem todas as características dos crimes homofóbicos.
A barbarização do corpo caracteriza essa relação de ódio. A transferência para o corpo do outro, da não aceitação de si mesmo, então precisa matar, e vai lá fazer todo esse processo de barbarização do corpo como uma espécie de ritual, como se estivesse expulsando de si o desejo.
Edição: Heloisa de Sousa