Após uma campanha na internet promovida pelos grupos e coletivos de cultura popular sobre seu paradeiro, finalmente Penha Cirandeira foi encontrada. A artista havia sumido da Paraíba há cerca de sete anos. Segundo Zé Silva (Grupo de Estudos Coco de Roda Acauã) e Nara Santos (Coletivo Jaraguá), Penha Cirandeira está morando em Jacarepaguá, no Rio de Janeiro e tem passado muitas dificuldades. “A gente está tentando entrar em contato com alguns grupos de Cultura Popular lá do Rio de Janeiro, alguns já falaram com ela para saber como ela está, e ela está da mesma forma que ela vivia aqui, pedindo esmola ou flanelinha. Então nada mudou nada, só mudou a cidade porque a dificuldade é a mesma. Mas ela ficou super feliz quando falou com a gente e está louca para voltar para a Paraíba”, conta ele.
Nara Santos complementa: “Infelizmente ela vive numa pobreza extrema e agora a gente está vendo quais ações de salvaguarda a gente pode pode alavancar a partir de agora que a encontramos, porque ela tem um talento incrível”.
Confira entrevista com Penha Cirandeira:
BdF: Como foi que encontraram a senhora?
Penha Cirandeira: Primeiramente me encontraram pelos vídeos que mandaram no Facebook e aí eu não sabia quem era que tinha mandado, aí meu filho procurou no YouTube e disse ‘Mãe é a senhora, olha’, e eu vi era eu na Festa das Neves. E eu me perguntei, meu Deus, quem será que colocou isso? Aí eu procurei o nome da pessoa que tinha colocado e tal e depois ele pensei deve ser os pessoal de lá da Paraíba que se lembraram de mim. Quando foi sábado a minha menina que mora na Paraíba ligou para mim e disse ‘mainha, eu dei o contato da senhora a um rapaz da Ciranda que estão doido para falar com a senhora’.
E aí quando pensa que não elas ligaram para mim, e foi aquela alegria, chorei emocionada com os pessoal e com Nara Santos porque eu viajei com ela e os tocador de Pife lá no Forte, na Festa das Neves, e é muita emoção.
BdF: Por que você foi embora?
Penha: Eu me desgostei da Funjope porque fazia uns 20 e poucos anos que eu estava pela Funjope e um dos diretores, só porque teve um evento da Festa das Neves que eu ia tocar, colocaram meu nome que eu ia me apresentar, e ele só porque eu só tinha duas pessoas para animar o grupo, ele me suspendeu e disse que eu não podia, que eu estava suspensa porque eu não tinha grupo e só brincava quem tivesse grupo e tal.
Aí eu comecei a chorar e eu disse ‘não faça isso comigo não’ e as meninas também, e ele disse não pode ser, é a lei. Perguntei ‘e meus meus documentos?’ e ele disse seus documentos vão continuar aqui e até hoje estão lá, não deram baixa, então eu chorando e tem uma mulher de um cabelinho curto dizendo ‘chore não Penha Cirandeira. Você é da gente’, e eu disse ‘nunca mais eu venho nessa Funjope’ e foi isso, eu nunca mais fui lá.
BdF: Isso aconteceu em que ano Penha?
Penha: Eu nem me lembro mais. Faz tanto tempo que eu não me lembro, mas faz mais de sete anos já. Aí eu voltei para casa também, não tinha ninguém aí na Paraíba. Meus filhos já estavam todos aqui no Rio e eu tinha um irmão meu aqui no RJ, porque eu não tinha ninguém e eu vivia na Paraíba de reciclagem.
E eu crio três netos e um filho adolescente também. E aí eu liguei para meu irmão. A única coisa que eu tinha era minha ciranda que eu arrumava um troquinho para dar de comer aos meus netos e pagar meu aluguel, porque eu não tenho casa própria. E ele falou minha irmã quer vir embora para cá? E eu falei quero sim. E ele mandou o dinheiro da passagem da gente e eu vim embora para o Rio de Janeiro. Fiquei na casa dele com meus filhos aqui e eu pensei que ia dar uma melhora para mim, mas foi piora. Agora eu tô morando num kitnet pagando aluguel, vivo de pedir esmola na rua para sobreviver porque a vida aqui não é fácil. E tá todo mundo parado também por conta dessa doença.
E eu esqueci todos os meus instrumentos, o zabumba, ganzá, triângulo, caixa, tô sem nenhum instrumento. Mas a minha cultura não saiu do meu pensamento não. Não saiu da veia não.
E desde que eu cheguei que eu não arranjei nenhum trabalho, só vivo de pedir esmola mesmo e catar latinha, alumínio para vender e sobreviver.
BdF: Então você vendeu os instrumentos ainda quando estava na Paraíba?
Penha:Não, eu não vendi nada, eu abandonei meus instrumentos, eu deixei lá com vizinho que eu morava lá perto porque eu não podia trazer, e eu deixei lá, eu não sei que fim ele deu. Diz ele que deu cupim mas eu não acredito.
BdF: Você chegou encontrar o pessoal da cultura popular?
Penha:Não não encontrei ninguém aqui da cultura popular, não sei nem onde é que fica.
BdF: E você ainda canta, pelo menos de brincadeira?
Penha: Com certeza, eu canto sozinha aqui dentro de casa, já hoje eu passei um bocado de ciranda aí um dos grupos que me colocaram. O pessoal acharam bonito e falaram uma voz dessa não pode se perder. risos. E disseram, Penha seja bem-vinda ao grupo, a gente ama você, a gente gosta muito de você, queremos você aqui, estamos precisando de você aqui.
BdF: E sobre composição, você compôs mais alguma coisa?
Penha: Não não compus nada não. Nem passou pela minha cabeça porque eu tenho muitas cirandas muitos cocos. Inclusive eu cantei uma nesse grupo que o filho do finado Cabureto, que eu não sabia que tinha morrido, vim saber pelo filho dele agora. E eu cantei até uma que ele disse que representa o pai dele.
BdF: Que encontro lindo, emocionante.
Penha: Eu amei esse reencontro, você não sabe o quanto eu estou emocionada. E o pessoal falaram aí que iriam fazer uma vaquinha para mim, para me ajudar.
Estão querendo também fazer uma vaquinha para eu voltar para Paraíba. Então vamos ver como é que fica. E aqui tá só a misericórdia. Eu saio para a rua mas saio com medo dessa pandemia
BdF: E você pensou em voltar para Paraíba em algum momento?
Penha: Já, já pensei em voltar assim, várias vezes. Mas voltar sem dinheiro é complicado.
Já falaram com a menina da cultura aqui do Rio de Janeiro e ela já falou comigo. Mas disse que por causa dessa doença, a pandemia, não pode entrar em contato agora comigo, mas depois que passar, eu já quero mesmo é estar na Paraíba. Eu já estava com vontade de ir embora, e agora ainda mais; quero ver meu povo. E o rapaz falou que ia fazer uma Live para os cirandeiros, em comemoração das cirandas, mas eu não entendi, eu vou falar com meu filho para ver se ele bota para ver para eu ver meu povo.
Edição: Heloisa de Sousa