O Governo Federal, através do Ministério do Turismo, anunciou no seu portal, em 10 de junho, a privatização da Fortaleza de Santa Catarina para instalação de empreendimentos hoteleiros, através do projeto-piloto Programa Revive implementado em Portugal, que entrega prédios arruinados à iniciativa privada.
O movimento cultural de Cabedelo, além de entidades, associações, organizações e partidos políticos vêm realizando campanhas contra a privatização e ressaltando que a Fortaleza de Santa Catarina funciona como um Centro Cultural, um Ponto de Cultura, de uso intenso pela comunidade, com atividades sócio cultural constantes, bastante frequentadas, e crucial para a população local e a região metropolitana.
São exposições, artesanato, eventos artísticos e turísticos que geram renda e ocupação. Segundo Osvaldo Carvalho, presidente da Fundação Fortaleza de Santa Catarina, atualmente funcionam várias atividades no espaço, tais como: Projeto Arte Cultura Catarina, da UFPB, grupo de teatro Alfredo Barbosa que faz anualmente a Paixão de Cristo, a Nau Catarineta de Cabedelo, o movimento de Música Popular de Cabedelo, o grupo Tambores do Forte que atua semanalmente no local;
A escola Mocambo de Capoeira Angola Paraíba; escola de yoga com a professora Kátia Bond; Banda de Música 12 de Dezembro; Sociedade de Escritores e Poetas de Cabedelo; instituições como Acica - Associação Cabedelense para Cidadania; Associação dos Artesãos de Cabedelo, tem um bazar do Artesanato e várias outras entidades que direta ou indiretamente atuam na Fortaleza com eventos cuja maioria são públicos e gratuitos.
“A Fortaleza é aberta todos os dias, das 8h às 17h, de domingo a domingo, com o apoio dos colaboradores nossos. Ela sobrevive apenas com as entradas de valores simbólicos de R$ 2 e R$ 1, cujo movimento não é tão grande, e a maioria desse movimento só cresce em janeiro. E também as atividades que existem de eventos como casamentos e aniversários que cobrem parte da nossa despesa que não dá para atender o mínimo de conservação. O estado mesmo só entra com o pagamento da conta de luz ”, explica Osvaldo.
Comunidade e setor Cultural indignados
Um grupo de cerca de 19 entidades culturais de Cabedelo e da Paraíba publicou, no final de junho, uma carta aberta às autoridades do estado para que intervenham contra a privatização da Fortaleza:
“É importante destacar que, no caso da Fortaleza Santa Catarina, parte-se de premissas equivocadas que nem de longe justificam ou são aplicáveis. A Fortaleza não é ‘Devoluta’ (Desocupado, sem uso) e, na verdade é muito bem usada pela população - certamente tem maior mérito do que servir de hotel”, aponta o documento.
Renálide de Carvalho, servidora pública e membro do coletivo Cabedelo Forte, conta que existe um grupo, o Unidos em defesa da Fortaleza, que debate essa ameaça de privatização: “Temos uma proposta, somos contra privatizar mas somos a favor de uma gestão compartilhada com a UFPB, a prefeitura, Governo do Estado, a própria Fundação da Fortaleza Santa Catarina, Associação de Cultura, de Artesãos e Agentes da cultura de Cabedelo, além do Iphan ( Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional )”.
Ela acrescenta que o grupo vem fazendo denúncias nas redes sociais: “Estamos nos reunindo via plataformas virtuais para concretizar um projeto de ações para dar visibilidade a essa campanha com faixas, outdoors e carros de som. Estamos também tentando encaminhar um diálogo com deputados e deputadas progressistas que possam estar à frente dessa luta”, enfatiza Renálide.
Júlio Mola, do Grupo Cultural Tambores do Forte, destaca a rejeição à privatização por parte dos artistas e da sociedade cabedelense: “Somos totalmente contra a privatização, assim como todas as entidades que estão lá dentro da Fortaleza, e assim como todos os grupos e artistas da cidade, a população, a comunidade em si. A gente percebe que algumas pessoas a favor estão envolvidos com politicagem, vemos isto como um ataque político, não só do governo federal, como municipal, aos grupos, aos mestres e ativistas, porque a arte educa e prepara a comunidade que acaba sendo uma ameaça a esse movimento de política corrupta, que é forte aqui”, denuncia ele.
Fernando Abath Cananéa, professor de artes e servidor aposentado da UFPB, realiza atividades na Fortaleza desde 1991 através de projeto cultural da Prac/Ufpb: “Nós entendemos que a Fortaleza é de fundamental importância para a história, a arte e a cultura, não só da nossa cidade cabedelense, mas também o que conta ali, a bravura, a história e a resistência do povo paraibano. Entendemos que ela não está abandonada, são 29 anos enquanto organizações da sociedade civil organizada e Universidade Federal da Paraíba contribuindo com a defesa daquele monumento e somos contra qualquer forma de privatização”, afirma o professor.
Uma petição pública está aberta para assinatura e divulgação: DIGA NÃO A PRIVATIZAÇÃO DA FORTALEZA SANTA CATARINA - CABEDELO/PB
O mais significativo monumento histórico-militar do Estado da Paraíba
Tombada pelo Iphan em 1938, a Fortaleza Santa Catarina em Cabedelo/PB é o mais significativo monumento histórico-militar do Estado da Paraíba, um dos maiores, mais bem conservados e visitados do Brasil. O espaço é administrado por grupos e instituições culturais da comunidade local desde 1991 que, através de muita luta, assumiram a manutenção da edificação que encontrava-se abandonada. Desde então é mantida, unicamente, pela sociedade civil, sem contar com recursos financeiros de nenhuma esfera do Poder Público.
Programa Revive
Criado em 2016, em Portugal o Programa Revive foi copiado no Brasil a partir de visita de comitiva brasileira e acordo feito em junho do ano passado em Portugal. Serão quatro patrimônios históricos brasileiros a receber o projeto-piloto do Programa Revive: Fortaleza de Santa Catarina, em Cabedelo/PB; Forte Nossa Senhora dos Remédios, em Fernando de Noronha/PE; Forte Orange, na Ilha de Itamaracá/PE; e Fazenda Pau D’Alho, em São José do Barreiro/SP.
A iniciativa conta com apoio da Secretaria Especial da Cultura (Secult - BR), Instituto de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), Secretaria de Patrimônio da união (SPU) e Secretaria Especial do Programa de Parcerias de Investimentos (SPPI). O próximo passo para a implantação do Programa será a contratação do estudo de viabilidade, pelo BNDES, para posterior elaboração dos editais de licitação que deverão conter os valores de outorgas e tempos de concessão. O Iphan, parceiro importante em todo o processo, irá auxiliar na construção do edital.
A assinatura do Protocolo de Cooperação entre o Ministério do Turismo do Brasil e do Ministério da Economia de Portugal ocorreu em 12 de março deste ano durante uma visita do ministro Álvaro Antônio ao país. O acordo tem validade de dois anos, sendo automaticamente renovado por sucessivos períodos com mesma duração.
Edição: Heloisa de Sousa