Paraíba

PERTENCIMENTO

Quilombo Caiana dos Crioulos comemora a conquista dos 50% restantes do seu território

Comunidade já existe há mais de 300 anos e só agora veio ter a posse do seu território

Brasil de Fato | João Pessoa - PB |
Território quilombola era destinado exclusivamente à moradia, o que tornava os quintais não produtivos - Foto: Reprodução

A Comunidade quilombola de Caiana dos Crioulos, em Alagoa Grande, Agreste paraibano, comemora esta semana (29) a conquista dos 50% restantes do seu território, identificado e delimitado pelo Incra na Paraíba como área remanescente de quilombo. A primeira parte foi assinada no dia 03/02, e agora finaliza a integralidade da área para as 130 famílias, com população de aproximadamente 600 pessoas.

Os R$ 1,4 milhão de recursos para pagamento da indenização pelo Sítio Sapé foram disponibilizados pela Secretaria Nacional de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (SNPIR) do atual Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos. 

Edinalva Rita, Presidente da Associação do Quilombo de Caiana dos Crioulos, comemora a vitória: “Finalmente nós recebemos os 50% que faltava da área, mesmo nesse período de dificuldade por causa dessa pandemia, nós acabamos de receber a imissão de posse do território quilombola por completo”, festeja ela.


Comunidade festeja a primeira imissão de posse, em 03 de fevereiro / Foto: Incra/PB

O superintendente do Incra/PB, Kleyber Nóbrega, comentou sobre esta conquista: “A imissão de posse traz novos horizontes às famílias, a esperança de uma vida melhor, com mais qualidade e segurança, e, ainda, a preservação da cultura e da memória de uma das mais conhecidas comunidades tradicionais do nosso estado”, afirmou.  

Uma luta que já durava quase 30 anos

As famílias estavam há quase 30 anos esperando pela justiça para que pudessem ter o seu território definitivo para trabalhar. Edinalva conta que a importância desta conquista é “muito mais do que qualquer pessoa possa imaginar” para as famílias, cujo território quilombola, era destinado exclusivamente à moradia, o que tornava os quintais não produtivos. 

Esta conquista é muito mais do que qualquer pessoa possa imaginar

“Essas famílias que hoje vivem aqui, antes da entrega do território, não tinham como se desenvolver. Hoje Caiana tem como sobreviver, produzir e se sustentar aqui na própria comunidade, sem precisar ter que se deslocar para os grandes centros”, destaca ela.

Até o ano passado as famílias não tinham direito aos restolhos da produção de alimentos. “Até as palhas do milho tinham que ficar na área dos proprietários para os animais comerem. A família colhia apenas os grãos, que era o resultado de sua colheita”, conta ela.

Mesmo com toda a dificuldade desse período de pandemia, a Caiana dos Crioulos já está colhendo milho, feijão e fava do território que foi entregue. O número de famílias que “põe o roçado” já triplicou: “Tem famílias, inclusive, que já estão comercializando a produção deste ano, deste inverno”, relata Edinalva.

A comunidade agora planeja fortalecer, tanto os projetos de desenvolvimento sustentáveis na parte agrícola, como na área do turismo de base comunitária.

“Com o território nós vamos poder produzir para sobreviver e comercializar para ter uma renda, e suprir as necessidade além da alimentação”


Reprodução / Foto

“Comunidades quilombolas, tenham fé”

A entrega do território foi um dia muito especial. “É uma alegria poder compartilhar com todos os nossos outros irmãos quilombolas, outras comunidades que ainda não têm o seu território. Tenham fé que podem um dia estar sentindo a mesma alegria que nós estamos hoje.

Nós não podemos fazer uma grande festa, mas assim que tudo isso passar, vamos reunir todas as família e fazer uma grande comemoração, inclusive com a nossa produção, com os nossos produtos colhidos desse território”, planeja Edinalva.

Justiça Histórica

Segundo a Conaq - Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas, a palavra quilombo é originária do idioma africano quimbunco, que significa: sociedade formada por jovens guerreiros que pertenciam a grupo étnicos desenraizados de suas comunidades.

“Aos remanescentes das Comunidades de quilombos que estejam ocupando suas terras, é reconhecida a propriedade definitiva, devendo o Estado emitir-lhes títulos respectivos”
Art. 68/ADCT/CF1988

O Território Remanescente de Comunidade Quilombola é uma concretização das conquistas da comunidade afro-descendente no Brasil, fruto das várias e heróicas resistências ao modelo escravagista e opressor instaurado no Brasil colônia e do reconhecimento dessa injustiça histórica

Os remanescentes de quilombo são definidos como grupos étnico-raciais que tenham também uma trajetória histórica própria, dotado de relações territoriais específicas, com presunção de ancestralidade negra relacionada com a resistência à opressão histórica sofrida, e sua caracterização deve ser dada segundo critérios de auto- atribuição atestada pelas próprias comunidades, como também adotado pela Convenção da OIT sobre Povos Indígenas e Tribais .

Foi apenas em 2003, com o decreto nº 4.887/2003 do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que foi regulamentado o procedimento para identificação, reconhecimento, delimitação, demarcação e titulação das terras ocupadas por remanescentes de quilombos.

As Comunidades Quilombolas certificadas no Brasil são, no total, 2.847, sendo 1.724 na Região Nordeste, área com a maior proporção.

 

 

Edição: Maria Franco