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Educação: entre a democracia e o autoritarismo

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"As elites brasileiras se formaram durante séculos a partir de uma concepção autoritária-escravista e profundamente excludente" - Foto: Reprodução
As elites brasileiras se formaram durante séculos a partir de uma concepção autoritária-escravista

Depois de dois traumáticos ministros da educação e um que nem chegou a assumir o cargo, mais de vinte dias se passaram até que alguém ocupasse efetivamente o ministério mais importante da república brasileira: o da Educação. O novo ministro, mal assumiu o cargo, já enfrenta dificuldades. Uma das primeiras questões colocadas diante da pasta foi o debate sobre o Fundeb (Fundo de Desenvolvimento da Educação Básica), deixado de lado pelo governo Bolsonaro desde o início de sua gestão. Mesmo diante da forte pressão da sociedade civil, o governo fez o que pôde para desgastar e impedir seu avanço. Após aprovada a proposta na Câmara dos Deputados, agora o governo se apropria da vitória, como se não tivesse se empenhado para desmontar o Fundo, sugerindo utilizar parte dos recursos para outros fins, reduzir a complementação da União e adiar sua ampliação para 2022. Mas por que tanta resistência em garantir recursos para a educação pública?

Defender a educação pública como um direito de todas as pessoas, valorizar os/as professores/as, debater o combate ao racismo, machismo e homofobia, promover a democracia nas escolas é o único caminho para que, de fato, possamos sonhar um país justo e desenvolvido


As elites brasileiras se formaram durante séculos a partir de uma concepção autoritária-escravista e profundamente excludente. Para elas, as pessoas negras, indígenas, as mulheres, os homossexuais, as pessoas com deficiência e todas aquelas que vivem de seu trabalho não deveriam existir enquanto cidadãs, logo, não deveriam ter direitos. Essa lógica autoritária e excludente se reorganizou no decorrer do tempo e sobrevive até hoje, apesar das mudanças históricas vivenciadas em nosso país. Isso pode ser visto, por exemplo, nas políticas para educação.

Durante séculos, acessar espaços formais de educação foi algo restrito a uma minoria, que tinha condições de pagar seus estudos ou, em caso do ensino superior, se deslocar para os grandes centros do Brasil ou de Portugal. Essa elite de “bacharéis” (quase todos homens e senhores de escravos) que, ao se formar, ocupou os cargos públicos e formulou as políticas do Estado brasileiro. Preocupou-se com a educação? Não, pois já tinha acesso a isso. Se formos pensar a história de nossa república e suas constituições, poucas foram as vezes em que a educação foi tratada de maneira mais cuidadosa (1934 e 1988), momentos em que o Brasil vivia grande efervescência e luta pela educação como um direito.


O gasto por aluno no Brasil não chega à metade da média de países desenvolvidos / Foto: Reprodução


A redemocratização nos trouxe uma breve ilusão de que as nossas elites respeitariam a constituição e a lógica de direitos fundamentais para a população, incluindo uma educação pública, universal e de qualidade. Conseguimos avanços importantes na ampliação do direito à educação, aumentando a quantidade de escolas e matrículas no ensino básico e superior. Muito longe do que o país precisa, é verdade. Desde 2016, porém, esse projeto autoritário-escravista (ou seja, racista, machista, homofóbico, excludente etc) se reconfigurou e ganhou espaço, tentando destruir todo e qualquer avanço – ainda que limitados – que tivemos nos direitos populares e democráticos. Aliás, buscou-se destruir também aqueles que defendem essas ideias de direitos e democracia.

Se formos pensar a história de nossa república e suas constituições, poucas foram as vezes em que a educação foi tratada de maneira mais cuidadosa (1934 e 1988), momentos em que o Brasil vivia grande efervescência e luta pela educação como um direito.


O governo Bolsonaro é a maior expressão disso. Um ponta desse iceberg. E a concepção de educação expressa por ele e seus ministros também. Para essas pessoas, a educação pública não deve ser um direito ou, caso exista, não pode ser um espaço democrático. Como explicar a perseguição aos professores e os cortes na educação pública? E os constantes ataques às entidades estudantis e sindicais da educação? E a falta de um projeto de expansão e desenvolvimento de uma política pública séria para a educação? Por que a proposta para ampliar as escolas militarizadas? Por que tentar inviabilizar o Fundeb? A resposta está na concepção autoritária do Brasil formada por nossas elites. Quanto menos recursos para a educação ou quanto mais a educação seja privatizada e repressora se tornando um serviço e não um direito, mais ela volta a ser um privilégio garantido para poucos.

A educação é um espaço de disputa e tem se mostrado uma importante área de resistência ao avanço do fascismo bolsonarista. Defender a educação pública como um direito de todas as pessoas, valorizar os/as professores/as, debater o combate ao racismo, machismo e homofobia, promover a democracia nas escolas é o único caminho para que, de fato, possamos sonhar um país justo e desenvolvido e não controlado por uma elite com uma mentalidade autoritária e escravista. Diante disso, a aprovação do Fundeb foi uma vitória do povo brasileiro, pois garante o mínimo de qualidade no ensino. Mas o caminho ainda permanece longo para todas as pessoas que lutam por um país mais digno, igualitário e democrático.

Edição: Cida Alves