Moradores da comunidade Dubai, no bairro Mangabeira VIII, foram vítimas de ação truculenta da Polícia Militar em ação realizada neste fim de semana, em João Pessoa. A polícia alega que a ocupação encontra-se situada em área de preservação ambiental, além de ser um ponto de droga. Com a justificativa de procurarem por drogas, destruíram os barracos e os pertences das pessoas. Moradores, que não querem se identificar, gravaram áudios, em conjunto, relatando o que aconteceu para o Jornal Brasil de Fato:
“Levaram celulares e dinheiro, e ainda espancaram um homem ali embaixo. Colocaram uma arma na cabeça de uma criança, rasgaram o pneu da bicicleta e ficaram querendo que a gente diga o nome de pessoas que nem tem na comunidade'
'Colocaram a gente de joelhos e sentados no chão por quase duas horas, no sol quente - só amansaram quando o pessoal chegou. Algumas pessoas passaram mal, duas mulheres passaram mal, e foram para o hospital'.
'Foram lonas rasgadas, saco de pão, fralda suja dentro do pão. Pediram que a gente desmanchasse todas os barracos. Quebraram brinquedos de crianças, carrinhos, pipas e mandaram as crianças abaixar as roupas para ver se tinha alguma coisa (droga). Vários brinquedos foram quebrados, além de fraldas e potes de comida das crianças'.
'Os policiais colocaram um saco na cabeça de um pai de família e ainda quebraram o dente dele. Uma mãe estava com um bebê no braço e uma criança no chão. Ela queria entrar no barraco com as duas crianças e o policial a barrou dizendo que não podia entrar, e deu um tiro para cima que ofendeu ouvido das criancinhas'
'Mandaram uma mulher grávida derrubar o barraco dela e havia criança recém-nascida dentro do barraco onde dormiam quatro crianças, a mãe e o marido”, contaram os moradores ao BdF.
Show de horrores
A comunidade estava em pleno desenvolvimento, e já contava com cozinha comunitária, nomes de rua, e energia em todos os barracos, água encanada e área de lazer. No entanto, tudo foi destruído.
Gleyson Melo, do Movimento dos Trabalhadores por Direitos (MTD), esteve no local e pôde averiguar o terror: “Foi um show de horrores patrocinado pela Polícia Militar da Paraíba. A operação precisa ser averiguada, quem coordenou esse despejo em plena pandemia, inclusive com violação de direito de mulheres, crianças e idosos”
São mais de 300 famílias que vinham se estabelecendo em Mangabeira VIII, nas proximidades do colégio Sivuca, há cerca de um ano: “Os policiais chegaram com truculência dando tiro próxima às crianças e usando balas de metal, algo que não pode ser usado nessas situações”, conta o militante.
Os policiais agiram com requintes de crueldade, rasgando pacotes de alimentos e derramando comida de panelas. “Eles não deram minimamente a oportunidade para as pessoas retirarem seus pertences, e na verdade, não havia um mandado de reintegração de posse”.
A imprensa foi proibida de entrar na ocupação: “Não deixaram a imprensa entrar para filmar esse show de horrores. Aliás espancamento e tortura é crime imprescritível, independente do período. Isso viola qualquer tipo de Conduta da Polícia Militar, dos agentes públicos nessa operação de sábado”, pondera Gleyson.
Já no domingo, a polícia chegou novamente na comunidade Dubai. As famílias permaneciam na entrada do local com crianças e mulheres grávidas. A polícia continuou impedindo que as equipes entrasse na área e isto levanta a hipótese de que, se realmente fosse uma ação pública correta e legal não haveria motivo para a polícia obstruir a presença da imprensa na comunidade.
Uma moradora afirma: “A polícia não pode chegar assim batendo nas pessoas para nos retirar, inclusive, sem ordem sem nada. Estamos aqui procurando o nosso direito porque essa terra foi Deus que deu. Tanta gente tem casa e a gente não tem. São pessoas que moravam na rua, que moravam de aluguel e de favor. E os policiais bateram nas pessoas e pegaram os pertences. A gente não pode passar por isso, somos seres humanos. E a única diferença é que esses policiais estudaram, tiveram farda e teve pessoas que não têm e nem teve oportunidade nenhuma de estudar. Se a gente não pode ficar aqui que nos dêem outro canto para a gente morar”, reclama ela.
O Capitão José Rusemberg se pronunciou para as Tvs locais e afirmou que os moradores vinham desmatando a área e usando a madeira para construir residências: “O pleito desse pessoal é justo mas na maneira como está sendo feito, eles estão cometendo um crime. E a gente está aqui para não permitir que eles continuem com esse processo de degradação do meio ambiente”, disse ele.
Estamos aqui procurando o nosso direito porque essa terra foi Deus que deu.
Em seguida, outra operação autoritária: Praia do Sol
Ainda no domingo, a polícia se dirigiu à ocupação Praia do Sol, em João Pessoa. A moradora D. Cida, que é cardíaca, foi levada sob acusação de ameaça à autoridade. Informações nos chegam de que todo sábado policiais vão até a localidade para fazer pressão na população. Além dos soldados, há pressão por parte do Sr. Nicola, que é candidato 2020 à Prefeitura de Santa Rita pelo PSCD, e se diz herdeiro da antiga Imobiliária Terral.
Gleyson Melo acredita que levar D. Cida para a delegacia foi para pressionar os moradores: “Não se trata de flagrante delito porque são até 48 horas. Na verdade, se fosse o caso de ameaça, teria que se gerar um processo, e ali é uma disputa litigiosa pela posse. Isso não se resolve na polícia ou na delegacia. Na verdade se resolve na Justiça, e que ele (Nicola) faça um processo de reintegração de posse”
Moradores foram à Ouvidoria de Polícia
Na quinta-feira da agressiva semana que se passou, moradores da Praia do Sol se dirigiram, juntamente com o MTD, até a ouvidoria da Polícia Militar para denunciar ao ouvidor Mário Júnior, abordagens e ameaças realizadas por um homem que se diz Coronel do Exército e que foi acompanhado de policiais armados para intimidar os moradores a se retirarem do terreno.
Um conflito permanente entre grileiros e posseiros existe na região. A polícia acaba atendendo ao chamado dos grileiros que correspondem a setores imobiliários. A ocupação da Praia do Sol existe há mais de seis anos e conta com cerca de 240 famílias divididas em dois loteamentos: Solemares e Morada do Sol.
Edição: Maria Franco