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COVID-19 e a Fome: abalo nas cadeias alimentares italianas

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Morador de Turim, norte da Itália, em 17 de março - Foto
A Itália, em março, foi o primeiro epicentro da doença na Europa

Por Ellen Maria Oliveira Chaves*

A velocidade de contágio da COVID-19 colocou todos em alerta ao redor do mundo. A Itália, em março, foi o primeiro epicentro da doença na Europa. Enquanto as informações sobre o vírus eram poucas, o seu impacto no país foi assustador. Com o objetivo de conter a propagação, medidas extremamente rígidas foram implementadas em nível nacional e trouxeram grandes consequências para a região.

O colapso no sistema de saúde, o desemprego e a recessão econômica colocaram em xeque a situação de milhões de italianos. Da mesma forma, a doença põe em risco a segurança alimentar global ao dificultar o acesso aos alimentos até mesmo nas economias desenvolvidas. O bloqueio das atividades nos primeiros meses provocou choques nas cadeias de abastecimento alimentar do país, causando a escassez dos produtos com alta demanda, como a farinha, e o aumento no custo de alimentos essenciais.

Mesmo após o controle da 1º onda de contágio, a Itália, em outubro, bate recorde de novos casos diários desde o início do surto no país. Com cerca de 430 mil casos e 36 mil óbitos, a Itália ocupa o 16º lugar no ranking mundial de infectados pela COVID-19 atualmente. A 2º onda de contágio está chegando também para outros países da Europa, como Espanha, França e Reino Unido. Entretanto, as autoridades italianas enfrentam a nova onda de forma mais efetiva que os países vizinhos.

A reabertura gradual, o aumento na capacidade de testagem e o rastreamento de pessoas que tiveram contato com os doentes foram essenciais para o atual cenário menos negativo. As medidas excepcionalmente restritivas de março e abril possibilitaram a criação de um senso de disciplina e responsabilidade nos cidadãos, mantendo-os alerta e com receio de um novo total isolamento. 
Para frear a nova onda de contágio, o primeiro-ministro Giuseppe Conte reinstalou algumas restrições a reuniões, restaurantes, esportes e escolas.

Isso trouxe lembranças dos primeiros meses de isolamento, que deixou cerca de 700 mil menores de idade, que dependiam das refeições nas cantinas, com insegurança alimentar devido ao encerramento de atividades escolares presenciais. A organização agrícola Coldiretti afirma que o aumento da demanda nos supermercados provocou o aumento nos preços dos alimentos, principalmente frutas, legumes e leite. 

Outro fator preocupante para o governo italiano foi o aumento da vulnerabilidade no país, pois cerca de 5 milhões de pessoas se encontram na linha da pobreza e 50 mil morando nas ruas. A terceira economia europeia buscou reverter a situação com a implementação de auxílios emergenciais. Em março, foi aprovado um plano de 25 bilhões de euros, e em maio, outro de 55 bilhões de euros, o que os tornaram os maiores pacotes de estímulos econômicos feitos pelo governo italiano.

Os trabalhadores informais, localizados em sua grande maioria na região sul do território italiano, que também é a região mais pobre do país, foram obrigados a parar as atividades devido ao isolamento. Com a perda de suas rendas, também ficaram sem condições de se alimentar adequadamente. O sul da Itália concentra zonas de produção de tomates, frutas e grãos que também dependem de mão de obra estrangeira para a colheita. Sem a ajuda, a produção foi ameaçada, por exemplo, na Lombardia, região que utiliza cerca de 70% de seu território para a agricultura.

A produção agrícola italiana é uma das mais importantes da União Europeia e pode movimentar um mercado de mais de 130 bilhões de euros tanto para o consumo interno como exportação. Dessa forma, além da crise de saúde, vários setores da cadeia produtiva estavam ameaçados pela falta da força de trabalho imigrante que, devido às restrições, não possuíam condições para ajudar nas colheitas, no transporte e na distribuição dos alimentos. 

Afetando não só os sistemas de saúde, mas também a segurança alimentar nos países ao redor do mundo, a pandemia da COVID-19 deixou as nações em crise. Projeções divulgadas pela FAO (Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura) afirmam que em 2030 a quantidade de pessoas com insegurança alimentar poderá ultrapassar 840 milhões de pessoas. Nesse sentido, mesmo a Itália, uma nação desenvolvida, sofreu com o abalo nas cadeias de abastecimento alimentar. Com o trabalho agrícola dependente de mão de obra imigrante, o aumento do desemprego e da vulnerabilidade social, é imprescindível o fortalecimento da capacidade da assistência alimentar emergencial do país. 

-Acesse o blog www.fomeri.org do Grupo de Pesquisa sobre Fome e Relações Internacionais para acompanhar as principais notícias e relatórios de organizações internacionais sobre como a pandemia afeta a segurança alimentar e nutricional pelo mundo

*O Grupo de Pesquisa sobre Fome e Relações Internacionais da UFPB é formado por: Prof. Thiago Lima; Ellen Maria Oliveira Chaves; Marcelly Thaís Marques Ribeiro; Paola Aparecida Azevedo de Souza

Edição: Henrique Medeiros e Cida Alves