Um mês foragido e nenhuma explicação. Esse é o quadro político da fuga do mentor do estupro coletivo de Queimadas. No dia 17 de novembro, Eduardo dos Santos Pereira, condenado a 108 anos de prisão, saiu caminhando pelo portão lateral do presídio de segurança máxima da Paraíba, o PB1, localizado em João Pessoa, capital paraibana. A explicação? Um agente poderia ter facilitado a sua fuga.
No momento, quatro policiais penais faziam a segurança do setor e foram levados à Central de Polícia para prestar esclarecimentos. Um deles foi autuado por facilitação culposa e liberado. Segundo a Polícia Civil da Paraíba, a facilitação é culposa porque a ação não teve a intenção de provocar a fuga, no entanto, um processo administrativo foi aberto para apurar todos os fatos.
No dia 24 de novembro, envolto a revolta do caso, o Movimento de Mulheres e Feminista da Paraíba, do campo e da cidade, lançou uma nota pública onde denuncia a fuga de Eduardo e pede proteção ao Estado para as vítimas e seus familiares, e as testemunhas do caso.
<<Mentor de estupro coletivo em Queimadas (PB) foge de presídio de segurança máxima>>
A nota também cobrava do Governador da Paraíba, João Azevêdo (Cidadania), um pronunciamento público a respeito do ocorrido. Até o momento nenhum pronunciamento foi feito. “Até mesmo, nem o afastamento do diretor do presídio foi feito, pois em qualquer situação de motim esse seria o procedimento, mas como para o Estado, a fuga do mentor do estupro coletivo e assassino de duas mulheres, não significa perigo à sociedade, tudo segue normalmente”, desabafou revoltada a militante Ana Cristina, da Marcha Mundial das Mulheres. Na nota, o movimento pergunta: “Como alguém foge andando pela porta lateral de um presídio de segurança máxima?” O documento completo pode ser conferido no link a seguir: bit.ly/3nSq4MU
Relembre o caso
Situada no Agreste da Paraíba, a cidade de Queimadas foi palco de um dos crimes mais hediondos da história do direito brasileiro e internacional. Trata-se do crime conhecido como a “Barbárie de Queimadas”, Cinco mulheres foram estupradas por dez homens – dentre eles três adolescentes. Duas delas foram assassinadas por terem reconhecidos os estupradores: Isabela Pajuçara (27 anos) e Michelle Domingos (29 anos). O crime foi “oferecido” por Eduardo dos Santos Pereira, a seu irmão, Luciano dos Santos Pereira, como presente de aniversário. Foi planejado com ao menos uma semana de antecedência, havendo o conhecimento de todos os homens envolvidos. Eles compraram cordas, fitas adesivas, máscaras entre outros acessórios para a tortura e destruição física dessas mulheres.
Um típico enredo de filme de terror: No dia 12 de fevereiro de 2012, as mulheres foram convidadas para a festa de aniversário de Luciano. Em algum momento da festa, as luzes foram apagadas, aumentaram o som para que ninguém ouvisse os gritos, e simularam um assalto. As mulheres foram amarradas e estupradas.
Devido à forte pressão do Movimento de Mulheres e Feminista da Paraíba, dos familiares das vítimas e do movimento dos Direitos Humanos, o julgamento do caso foi célere e causou comoção e indignação na população brasileira e mundial. Muitos protestos, movimentações e denúncias foram realizadas pelo movimento na ocasião do crime.
Ainda em 2012, seis dos autores foram condenados por estupro, cárcere privado e formação de quadrilha, a uma pena que se fosse somada corresponderia a 186 anos de prisão e os adolescentes envolvidos iniciaram o cumprimento das respectivas medidas socioeducativas.
“A situação atual demonstra apenas o quanto o Estado Brasileiro banaliza os crimes contra a vida das mulheres. É como Rita Segato - antropóloga e professora titular e emérita da UnB, aposentada há pouco tempo - diz: o Estado é uma espécie de máfia contra as mulheres, existe um segundo Estado, uma fraternidade criminosa entre homens. Pois vejam: Como o Governo do Estado da Paraíba não pode ser responsabilizado por essa ação? É impossível. Estamos acionando a Anistia Internacional para apurar essa violação grave e averiguar o descaso do governo da Paraíba com as vítimas e com a sociedade, que corre graves riscos com um fugitivo de alta periculosidade como esse solto às ruas”, declara Ana Cristina, militante da Marcha Mundial das Mulheres.
Edição: Maria Franco