Toda essa trajetória e história do MEL teve como expoente e símbolo, o ativista Luciano Bezerra...
Cleudo Gomes* e Joel Cavalcante**
O Movimento do Espírito Lilás (MEL) comemora 29 anos de existência e resistência na defesa dos direitos humanos da população LGBTQIA+. Foi fundado em 06 de março de 1992 na cidade de João Pessoa, ficando conhecido em toda a Paraíba e pelo país afora pela sua sigla que se tornou sinônimo de luta social e enfrentamento a LGBTfobia no estado.
Como um dos grupos precursores do, então, movimento homossexual dos anos de 1990, o MEL surgiu no momento de reflorescimento do movimento social no Brasil, época em que a luta por direitos políticos e sociais ganhava força, principalmente em virtude do processo de redemocratização que o país vivia naquela década. Por isso, o MEL sempre esteve envolvido na luta pela democracia e pelos direitos humanos no Brasil, tanto que, na Paraíba, tornou-se comum ver os ativistas do movimento LGBT nas passeatas e atos pelo direito das mulheres, moradia, educação, saúde e segurança pública, entre outros.
Desde a sua fundação, o MEL tem como missão promover e defender a cidadania e os direitos civis da população LGBTQIA+, tanto que surgiu como um grupo misto, em que gays, lésbicas e travestis participavam conjuntamente de suas atividades. Contudo, o público focal do MEL foram os homossexuais masculinos, mas no decorrer dos anos contribuiu para o fortalecimento e o surgimento de outros agrupamentos identitários para potencializar a luta das mulheres lésbicas, bissexuais e transexuais, a exemplo do Grupo de Mulheres Lésbicas e Bissexuais Maria Quitéria (GMMQ) e a Associação de Mulheres Travestis, Transexuais e Transfeministas do Estado da Paraíba (ASTTTRANS-PB), ambos fundados em 2002.
A primeira década do século XXI foi marcante, sendo o período em que o movimento se consolidou em todo o estado, promovendo ações de formação política para novas lideranças e incentivando a criação de novos grupos LGBT+ em diversos municípios paraibanos. De Cajazeiras à Cabedelo, aconteceram atividades que culminaram na realização da “1ª Parada pela Diversidade Sexual da Paraíba”, na praia do Cabo Branco, no ano de 2002, promovida pelo MEL. A parada tornou-se um marco para a luta social, já está em sua 19ª edição, anualmente tem a participação de milhares de pessoas e faz parte do calendário turístico do estado.
Ainda durante os anos 2000, o MEL reivindicou e participou ativamente da elaboração, implementação e execução de políticas públicas para LGBT+, especialmente do “Programa Brasil sem Homofobia”, ação pioneira que brotou em 2004 no Governo Lula (2003-2011). Além da participação no ciclo de Conferências de Políticas Públicas para LGBT, iniciado no ano de 2008, nas três esferas federativas, o que possibilitou a criação de instâncias de políticas setoriais para o segmento na Prefeitura de João Pessoa e no Governo da Paraíba, como também a inauguração de serviços de atendimento e enfrentamento à LGBTfobia, a exemplo da delegacia que apura crimes homofóbicos e dos centros de referência às vítimas de preconceito, discriminação, violência e intolerância por orientação sexual e identidade de gênero.
Toda essa trajetória e história do MEL teve como expoente e símbolo, o ativista Luciano Bezerra Vieira que, carinhosamente, ficou conhecido como a abelha rainha, por liderar toda uma colmeia. Luciano Vieira foi educador de uma geração de militantes que, hoje, atuam profissionalmente em diversas áreas do conhecimento. Ele sempre associava a luta pelos direitos LGBTQIA+ ao combate ao racismo, machismo e todas as formas de discriminações e preconceitos, além da luta política por uma sociedade mais justa e solidária. Em 2017, a colmeia sofreu com a sua partida, mas o MEL não sucumbiu, resistiu e permanece em plena atuação.
Em 2020, no auge da pandemia da COVID-19, preocupado com as pessoas LGBTQIA+ em situação de vulnerabilidade social, o MEL promoveu, em parceria com o Governo do Estado, Prefeitura Municipal de João Pessoa e as entidades do movimento social da capital, a doação de alimentos e material de limpeza, além do “Projeto Diálogos LGBTI+” por meio de suas redes sociais, com uma série de lives em que foram debatidos temas com ênfase no segmento.
O MEL caminha rumo aos 30 anos de existência com muita potencialidade em sua história e memória, mas com inúmeros desafios que o tempo presente impõe, desde a necessidade de ter uma sede própria, como retomar formação política para juventude LGBTQIA+ e novas lideranças, além de dialogar com os novos formatos de ativismo que ora se apresentam através do ciberativismo e novos coletivos que se opõe ao modelo institucional.
Sem dúvida, se hoje o Brasil reconhece o direito ao casamento civil homoafetivo, o direito de mudança de nome no registro civil das pessoas trans sem necessidade da cirurgia de redesignação sexual, a homofobia equiparada ao racismo para efeito de criminalização, se liberdade de ensinar sobre gênero e sexualidade foi reconhecida pelo STF, se vários órgãos protetivos para a população LGBTQIA+ existem, dentre outros direitos e políticas públicas, o MEL colaborou muito para essas transformações sociais e jurídicas.
*Doutorando em Educação e Graduado em Pedagogia. Pedagogo e Educador Popular. Membro do Núcleo de Cidadania e Direitos Humanos/UFPB e Associado do Movimento do Espírito Lilás – MEL.
** Mestre em Educação, Graduado em História e Direito. Professor, Advogado. Membro do Núcleo de Cidadania e Direitos Humanos/UFPB e Associado do Movimento do Espírito Lilás – MEL.
Edição: Maria Franco