Paraíba

17 de março

Celebrar o nascimento da nossa própria voz: Elis Regina

Há 76 anos, nascia Elis, a cantora dos palcos do mundo, mas principalmente dos palcos brasileiros

Brasil de Fato | João Pessoa (PB) |
Elis Regina - início da carreira - Reprodução

Comemorar o nascimento de Elis Regina, nesse 17 de março, é celebrar o nascimento da nossa própria voz. Quando, há 76 anos, nasceu Elis Regina Carvalho Costa, "atrapalhando o café da mamãe", ninguém sabia ainda, mas, nascia no Brasil a voz que iria ajudar a nos compreender enquanto pessoa e enquanto povo.

Da ondas da Rádio Gaúcha ao "Arrastão" dos festivais. Do Circuito Universitário no Brasil ao palco consagrado do Festival de Jazz de Montreux. Do picadeiro de Falso Brilhante ao circo desarmado no mesmo teatro na sua despedida, Elis nos fe(a)z orgulhosos da nossa identidade e da nossa gente.


Elis, no Festival Internacional de Jazz, em Montreux, em 1979. / Reprodução


Do nascimento ao encantamento, fomos atravessados pela intensidade da sua vida, palavras, ações e Arte. Maestrina da esperança. Regente da força que nem sabíamos ter.

Elis chamou os militares de "gorilas" em uma entrevista na Holanda. Depois disso, foi coagida a cantar para o Exército.

Foi uma das poucas artistas brasileiras a visitar Rita Lee na prisão. Foi incansável na defesa da amiga.

Amiga de Dom Hélder Câmara, em um show no Recife, foi proibida pela censura de dizer no palco o nome do estudante Edval Nunes da Silva, o Cajá, preso e torturado pela ditadura militar. No dia seguinte, armou uma cena antes do início do show. Fingindo que um músico da banda estava sentado na plateia, ordenou para o baterista imaginário: "Vem pra CA JÁ!". Driblou os censores. Não conseguiu visitar o estudante na prisão, mas escreveu uma carta linda pra ele.

Deu voz às músicas de compositores brasileiros exilados durante o regime militar. Cantou as dores e as agruras do Brasil pelos palcos. Gravou "O Bêbado e a Equilibrista", hino da Anistia.

Arrecadou dinheiro e o entregou a um certo Luiz Inácio Lula da Silva para apoiar a greve dos metalúrgicos no ABC Paulista. O resto é a história que a gente sabe bem e que transformou esse país.


Elis Regina e Lula / Jornal Movimento/ Apesp.


Levou a música brasileira para muitos palcos do mundo, mas principalmente para os palcos brasileiros, vide os Circuitos Universitários. Sua carreira internacional nunca conseguiu se consolidar porque ela não aceitava sair do Brasil e viver longe da sua terra e da sua gente.

Depois de sua morte, sem querer e sem merecer, foi alvo de uma capa e de uma matéria odiosa na revista Veja. Inconscientemente, nos mostrou as "qualidades" da publicação.

Celebrar o legado de Elis não é apenas celebrar a maior voz desse país. É celebrar a pouca vida que tanto fez. Muito mais do que muitos imaginam. Se Maria Rita, sua filha, já escreveu que o dia 19 de janeiro, data de sua morte, era um dia que "desejava, com todas as suas forças, que nunca tivesse acontecido", o 17 de março é um dia que desejamos que sempre aconteça: o despertar da voz de um povo que se compreende dono de si, apesar de tudo.

Feliz aniversário, dona Elis. Você vive!

 

Marcus Paulo Linhares é Mestre em Direitos Humanos e Educador Social

Edição: Heloisa de Sousa