Os direitos humanos nada mais são do que os direitos básicos que todos nós temos para uma vida digna
Por Joel Martins Cavalcante*
São setenta e dois anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH), uma reposta humanizada que a Assembleia Geral das Nações Unidas deu à barbárie (ou barbáries) que o mundo conheceu na primeira metade do século XX. Nesse momento, que deveria ser de comemorações e reflexões sobre os direitos básicos que todos nós temos, infelizmente se percebe, ao mesmo tempo, a ascensão de discursos autoritários e de viés fascista relacionados aos direitos humanos.
Quando a DUDH foi proclamada, em 10 de dezembro de 1948, o mundo já tinha conhecido não apenas o “progresso” (desconfio muito desse conceito) vindo com as revoluções na técnica de produção dos séculos antecedentes, com a ascensão das novas tecnologias que mudaram para sempre a história econômica, política e cultural da humanidade. Mas também viram que os mesmos conhecimentos que diminuíram as distâncias, que possibilitaram novas formas de sociabilidade e trouxeram comodidade para os lares, foram utilizados, na primeira metade do século XX, para a destruição e a morte de milhões de pessoas durante as duas grandes guerras mundiais, a experiência nazista e fascista e o stalinismo.
É lamentável ouvir, nos meios de comunicação de massa, sobretudo nos “programas jornalísticos” de rádio e TV, que têm uma influência sobremaneira na formação da opinião pública, discursos que desprezam os direitos humanos. Quem nunca ouviu ou viu: “direitos humanos são direitos de bandidos”, “cadê os direitos humanos que não foram visitar a família da vítima?”, “esses militantes dos direitos humanos são todos financiados pelo governo”, “a segurança pública não melhora devido aos direitos humanos”, etc. No Facebook, cansei de responder argumentos assim.
Penso que não devemos entrar numa ofensiva para responder a todos que pensam de forma distorcida a respeito dos direitos humanos. Agora, quando uma pessoa vem com opiniões distorcidas, eu pergunto o que ela acha da liberdade de escolher a sua crença religiosa, do direito ao trabalho, da possibilidade de matricular o filho em uma escola pública, da liberdade de expressar seus pensamentos, inclusive criticando os direitos humanos, sem ninguém para tutelar sua opinião, etc. Quando a pessoa responde, eu, em seguida, afirmo: então, você defende os direitos humanos! Ninguém em sã consciência e com as faculdades mentais em boa forma vai desprezar esses direitos fundamentais.
É preciso ter em mente e ensinar nas escolas, grupos pastorais, movimentos, coletivos, etc., que os direitos humanos nada mais são do que os direitos básicos que todos nós, seres humanos, independente de nossa fé, cor, classe social, sexo ou qualquer outro aspecto que serve para nos diferenciar uns dos outros, temos para viver uma vida digna.
É preciso compreender, também, que quando existem assaltos, assassinatos, estupros e outros crimes cometidos no cotidiano de uma sociedade tão violenta como a nossa, estão sendo negados e violentados os direitos humanos: direito à propriedade, direito à vida, direito à dignidade sexual. A culpa, portanto, não está no fato de termos direitos humanos, mas no fato de que esses direitos não se concretizaram na prática. Está na ausência de ações e políticas concretas no campo da segurança pública por parte do poder público, somando-se com a desigualdade social, o crime organizado (tão organizado que persiste no tempo e está entranhado em todos os poderes constituídos), dentre vários outros fatores estudados pelas ciências criminais.
A DUDH é composta por um preâmbulo que explica os motivos de sua feitura e por trinta artigos que versam sobre os direitos básicos que todos os seres humanos precisam para ter uma vida digna. Os críticos dos direitos humanos deveriam, antes de qualquer coisa, ler a declaração; certamente veriam que o que lá está escrito não privilegia um determinado sujeito em detrimento de outro. Pelo contrário, a busca – ainda não alcançada infelizmente – é por uma sociedade em que todos tenham as condições mínimas para viver como gente, como ser humano.
*Professor de História da Rede Estadual de Ensino da Paraíba, Advogado, Mestre em Educação pela UFPB, Especialista em Educação em Direitos Humanos (UFPB) e em Direitos Fundamentais e Democracia (UEPB). Foi conselheiro suplente do Conselho Estadual de Direitos Humanos da Paraíba (2014-2016) e Secretário de Educação, Cultura e Esportes de Alagoinha – PB (2017). Atua em movimentos sociais ligados aos Direitos Humanos e à Diversidade.
Edição: Cida Alves