O Ministério Público Federal (MPF) ajuizou, na primeira quinzena de junho de 2021, ação civil pública em que requer, perante a Justiça Federal, que a Universidade Federal da Paraíba (UFPB) apresente, em 90 dias, projeto de adequação às normas de acessibilidade, de acordo com a NBR 9050/2015, suprimindo todas as barreiras arquitetônicas que impossibilitem o pleno acesso das pessoas com deficiência no campus I da instituição federal de ensino. Conforme o pedido de liminar (tutela de urgência ou de evidência), a adequação do campus deve ser executada em, no máximo, um ano, contado a partir do deferimento da liminar, e deve contemplar todas as adaptações mencionadas em documento de informação técnica produzido por perito do MPF em 2017.
Ainda conforme o pedido do MPF, ao final do prazo de execução das obras, a UFPB deve apresentar laudo técnico com anotação de responsabilidade técnica (ART) ou registro de responsabilidade técnica (RTT) como prova do cumprimento das adequações executadas no campus. Se houver descumprimento desse prazo, o Ministério Público pede que seja fixada multa de R$ 1 mil, por dia de atraso. O órgão ministerial também pede que a UFPB seja condenada ao pagamento de R$ 200 mil, por danos morais coletivos, e aos ônus de sucumbência, no que couber.
A falta de acessibilidade na UFPB vem sendo apurada pelo MPF por meio do Inquérito Civil nº 1.24.000.000395/2013-86, instaurado em 2013, a partir de denúncia sobre a falta de acessibilidade no então novo prédio da pós-graduação em Física, no campus I da instituição. Conforme o relato, o prédio não possuía elevador, tinha corredor e portas estreitos, acesso ao banheiro limitado e ainda havia um corrimão de metal que aquecia muito durante algumas horas.
Para averiguar os fatos denunciados, o Ministério Público Federal realizou diversas diligências no campus I da UFPB, dentre as quais, três vistorias feitas por analista perito em engenharia, que constatou que as incongruências apontadas no estudo, praticadas pela universidade, caracterizam “clara discriminação e exclusão social” às pessoas com deficiência, tolhendo-lhes o direito de “realizarem as atividades inerentes à vida pessoal e acadêmica de forma plena”.
Em junho de 2018, na busca por uma solução extrajudicial, o MPF se reuniu com o prefeito da Cidade Universitária e com o arquiteto da instituição, para apresentar o laudo produzido pelo perito do MPF quanto às necessidades de adequações estruturais do campus I (João Pessoa, Santa Rita e Mangabeira). Na reunião, os representantes da universidade mencionaram que medidas estariam em andamento para solução da questão e se comprometeram a informar o MPF acerca do prazo em que tais providências poderiam ser finalizadas.
Desde então, o MPF expediu uma série de ofícios à instituição, solicitando informações sobre a adoção das referidas providências. Ao longo dos três últimos anos, as respostas da universidade se resumiram a informar que, após reforma administrativa na antiga Prefeitura Universitária, as questões relativas à infraestrutura passaram a constituir atribuição da Superintendência de Infraestrutura, e a remeter documento relativo à capacitação de terceirizados para atendimento a pessoas com deficiência. Em outros momentos, não respondeu os reiterados ofícios do Ministério Público.
Finalmente, em 2 de junho de 2021, a UFPB apresentou resposta que confirmou que persiste o descumprimento das normas de acessibilidade no campus I. Embora a reitoria tenha afirmado que estão sendo adotadas providências, “o que se extrai do documento é que ainda não há elevadores ou plataformas elevatórias, permanecendo a impossibilidade de que os alunos com deficiência acessem os pisos superiores, não há quantidade de banheiros acessíveis adequada, tampouco foi finalizada a adequação das escadas dos blocos, com sinalização dos degraus e corrimãos dentro dos padrões”, registra o MPF na ação ajuizada.
Entre as medidas realizadas elencadas na resposta da universidade estão: abertura de processo licitatório para aquisição de elevadores e plataformas de acessibilidade; conclusão de projeto técnico de adequação para vagas de estacionamento para PCDs, tendo finalizada a demarcação de vagas e sinalização vertical; conclusão dos serviços de manutenção do estacionamento e adaptação das calçadas da central de aulas; construção de acessos às lanchonetes e quiosques da central de aulas; determinação à empresa responsável pela limpeza e conservação do campus para não mais utilizar os banheiros acessíveis como depósito de materiais; elaboração de projetos e projetos em andamento para adequar banheiros às normas de acessibilidade; instalação de 13 bebedouros acessíveis; realização de campanha de conscientização dos motoristas sobre as vagas destinadas aos PCDs e capacitação de terceirizados para atendimento a pessoas com deficiência.
O MPF pondera que, embora tenham ocorrido diversas melhorias pontuais, as tentativas não foram suficientes para garantir a plena acessibilidade, motivo pelo qual considerou esgotadas as tentativas extrajudiciais de solução para a falta de acessibilidade no campus I, da UFPB. Diante do fato de que a acessibilidade no campus da instituição não pode ficar indefinidamente à mercê da boa vontade dos gestores, restou ao órgão ministerial buscar a intervenção do Poder Judiciário para garantir a ampla acessibilidade às pessoas com deficiência ou mobilidade reduzida, explica a ação. O Ministério Público ainda ressaltou que “a mera alegação, sem comprovação, de dificuldades materiais e de pessoal da UFPB não pode afastar o dever estatal em implementar direitos sociais”.
Descrédito e desestímulo – Em sua argumentação, o MPF aponta que a omissão de providências efetivas para atendimento de normas de acessibilidade, por quaisquer entes da administração pública, compromete a imagem e credibilidade do Estado como um todo “já que este exige dos particulares acessibilidade em prédios privados e, contraditoriamente, estaria negligenciando o mesmo aspecto em prédios públicos”. O órgão fiscal da lei também argumenta que, no caso da UFPB, a falta de acessibilidade nos edifícios da universidade certamente “implica desestímulo ao ingresso de estudantes com deficiência na instituição de ensino promovida, uma vez cientes de que não terão garantido o acesso igualitário às respectivas instalações físicas”. Ao justificar o cabimento da tutela de urgência, o MPF alerta que não se pode admitir que a demora necessária do processo judicial se constitua em mais uma barreira para as pessoas com deficiência. Ao contrário, a situação exige uma resposta imediata do Estado-Juiz à necessidade de implementação da acessibilidade.
Edição: Heloisa de Sousa