Nesta última semana, uma criança de apenas 9 anos de idade foi cruelmente hostilizada por torcedores do Santos Futebol Clube em uma partida clássica entre Santos e Palmeiras pelo Campeonato Brasileiro. Bruno Nascimento que é torcedor do Santos, ao fim da partida que terminou em vitória do Palmeiras por 2 x 0, pediu a camisa do jogador e goleiro palmeirense Jaílson. Parte da torcida santista do local começou a gritar, vaiar e hostilizar a criança, que teve que ser protegida pela polícia.
O garoto ainda fez um vídeo comovente na internet dizendo que devolveria a camisa do goleiro e pedindo repetidas vezes desculpa pelo ocorrido, afirmando que “devolvo a camisa pra ele, pra não me baterem nos jogos”. Bruno é um apaixonado por futebol e apesar de ser torcedor do Santos FC, admira outros jogadores, se inspira em suas histórias e gosta de ver jogos de outros clubes pelo simples motivo de amar o esporte, pelo simples fato de ser encantando por futebol. Bruno e seu pai ainda sofreram ameaças através das redes sociais. Ex-jogadores santistas consagrados como Pelé e Neymar mandaram mensagens de apoio para Bruno, e os goleiros palmeirenses Weverton e Jaílson enviaram presentes e ligaram para o menino.
Por que tanto ódio em espaços que deveriam ser de celebração?
Recentemente o árbitro Rodrigo Crivellaro foi espancado durante uma partida de acesso do Campeonato Gaúcho. Rodrigo ficou desacordado em campo e teve que ser retirado às pressas para o hospital após ser agredido com socos e chutes pelo jogador William.
Também aconteceram cenas lamentáveis de violência num jogo entre Palmeiras e Grêmio, quando torcedores gremistas ao fim da partida invadiram o gramado chutando cadeiras e depredando o espaço ao redor incluindo a cabine do VAR (painel do árbitro de vídeo).
O futebol não é um espaço para ódio, porque ele nasce como forma de integração e união. O futebol, como afirmou Eduardo Galeano, “é um espetáculo com muitos protagonistas que se lançam numa aventura para a liberdade”. O futebol se expande além dos campos perpassando nos âmbitos culturais, sociais e políticos. Hostilizar uma criança e disseminar seu ódio fanático amedrontando um menino que vê o esporte e o futebol com sua grande aventura para a liberdade é imaturo, ridículo e desumano.
O futebol está carregando nas costas o peso de um desequilíbrio capital, midiático e social que desaguam em forma de violência, desrespeito e preconceito há algum tempo. Ninguém suporta mais o que vem sendo feito do futebol nesses últimos anos, ninguém aguenta mais ter que ler ou assistir a um festival de agressões. Onde foi que deixamos para trás os talentos, a festa, os cânticos dos torcedores, as brincadeiras e provocações sadias? Quando foi que resolvemos matar os sonhos das crianças em prol da nossa imaturidade de torcedores? Como bem disse em entrevista o pai do Bruno, “ Meu filho sonha em jogador de futebol e mesmo torcendo pro Santos ele vê o futebol além, gosta de todos os jogadores, se inspira em muitos. Tem respeito por todos os times”.
O que está acontecendo com o país do futebol?
O país que mais exporta talentos do futebol vem se tornando palco de uma enxurrada de discursos, atos e manifestações de ódio. Ir ao estádio não é mais empolgante e poético como discursou Nelson Rodrigues, que por sinal, se vivo, ia estar envergonhado com o que veria hoje e talvez aposentasse a caneta que rabiscou tantos momentos áureos do futebol brasileiro.
O futebol é um fato social, político e cultural, e diante de um Brasil devastado por uma política genocida e sanguinária, não é a toa que isso reflete no esporte. A torcida saudável, o jogo alegre, o entretenimento dos domingos, passou a ser posse de grupos mal intencionados que usam de atletas, dirigentes e fake news para disseminarem seu ódio. O país do futebol tá doente e precisamos salvar nossas arquibancadas lotadas, por isso, deixo aqui as esperanças que nascem dos gramados: temos um Paulinho que luta contra a intolerância religiosa, temos uma Marta que luta contra a desigualdade de gênero, temos uma Formiga que resiste ao tempo... Temos muito ainda por caminhar, muito a aprender, mas continuo (ainda) tendo esperanças que um dia voltaremos a amar e sorrir com a pátria das chuteiras.
Edição: Heloisa de Sousa