Paraíba

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Mãos que amparam ou mãos que machucam?

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Mãos que amparam. - Darcy Lima
Uma em cada 4 mulheres sofre violência obstétrica no Brasil

Por Casa Lua Cheia*

 

Hoje estamos em meio aos 16 Dias de Ativismo Pelo Fim da Violência contra as Mulheres, campanha internacional iniciada em 1991 por ativistas do Instituto de Liderança Global das Mulheres e que acontece todos os anos desde então. 

De 25 de novembro, Dia internacional pela eliminação da violência contra a mulher, a 10 de dezembro, Dia dos Direitos Humanos, com o endosso da Secretaria Geral das Nações Unidas, mobilizam-se ações de sensibilização e ativismo contra a violência direcionada a mulheres e meninas, em todo o mundo, por diferentes organizações, instituições e movimentos sociais.

A violência obstétrica é entendida como toda violência física, psicológica, verbal, sexual ou patrimonial praticada contra as pessoas grávidas, no parto ou puerpério (em diversas práticas nos sistemas de saúde, público ou privado) na maioria das vezes é também violência de gênero, por ocorrer contra mulheres e em relações desiguais de poder, se agravando quando somada ao racismo (mulheres negras e indígenas). A violência é física quando as mulheres são submetidas a uma prática ou intervenção desnecessária ou sem o seu consentimento (como por exemplo ocitocina venosa, episiotomia, compressão do fundo uterino - Kristeller, uso de fórceps, não poder comer ou beber, se movimentar ou escolher a posição em que quer parir, cesariana sem indicação, entre outras); por negligência, quando não consegue acesso a atendimento no ciclo gravídico-puerperal e também quando a Lei do Acompanhante não é respeitada; sexual, por assédio ou exames de toque vaginal em excesso; verbal, por falas que constrangem e ofendem (em relação à sua cor, sexualidade, religiosidade, número de filhos ou escolhas em relação ao parto); psicológica, por qualquer ação por parte da equipe de saúde que faça a mulher se sentir insegura, abandonada, vulnerável, infantilizada ou inferiorizada.

Em 2010, a pesquisa Mulheres Brasileiras e Gênero nos Espaços Públicos e Privados, da Fundação Perseu Abramo, apontou que 1 em cada 4 mulheres sofre violência obstétrica no Brasil. A Organização Mundial da Saúde (OMS), em 2014, reconheceu a violência obstétrica como questão de saúde pública e os abusos como violação dos direitos humanos.

Em 2017, o Ministério da Saúde publicou as diretrizes nacionais de assistência ao parto normal, a fim de implementar a Política Nacional de Parto e Nascimento no Brasil.  A portaria 569 de 2000, do Ministério da Saúde, que institui o Programa de Humanização no Pré-natal e Nascimento do SUS,  diz: que “toda gestante tem direito ao acesso a atendimento digno e de qualidade no decorrer da gestação, parto e puerpério” e “toda gestante tem direito à assistência ao parto e ao puerpério e que esta seja realizada de forma humanizada e segura”. A Lei do Acompanhante, no. 11.108, de 7 de abril de 2005, garante às parturientes o direito da presença de acompanhante durante todo o ciclo gravídico-puerperal.

Há um ano, no final de 2020, a coletiva latino-americana de parteiras, aprendizes, doulas e profissionais de saúde de assistência à gravidez e ao parto/nascimento Matria realizou um inquérito com mulheres de diversos países da América Latina. Nos resultados, mostrou-se que as mulheres que pariram em casa e com parteiras relataram menos casos de violência obstétrica em suas vivências de pré-natal/parto/puerpério e mais experiências de partos respeitados e felizes.

As parteiras, além de aliadas do sistema de saúde no enfrentamento da violência doméstica, pela proximidade que têm com o casal/família, são agentes de um cuidado artesanal, familiar, comunitário e prioritariamente não-violento e de paz. Não instrumentalizaram desnecessariamente o cuidado que fazem com as próprias mãos e diretamente nos corpos das mulheres e bebês, atendem as mesmas empaticamente espelhadas em suas próprias vivências de parto, são mulheres que são lideranças comunitárias e fazem seu ofício o compreendendo enquanto missão, que embora pequena em número e abrangência, é grande em comprometimento e clareza do impacto desses eventos na vida das mães e principalmente das crianças, no que toca ao primeiro direito humano que é o de bem nascer.

Avançar na transformação positiva do cenário do parir e nascer requer muitas mãos entrelaçadas em rede, formando um tecido quente e forte no cuidado às mulheres, bebês e famílias, com respeito a cada uma que compõe essa rede e visando o bem cuidar de quem passa por essa vivência. Só assim devolveremos às mulheres seus corpos e sua autonomia e às crianças seu tempo e confiança no mundo e em quem recebe a vida que se reinicia.  

 

*Coluna coletiva assinada pela Casa Lua Cheia.

Edição: Heloisa de Sousa