De segunda (06) até esta terça (07) foram confirmados 13 casos de Covid-19 nos moradores removidos da comunidade Dubai, em Mangabeira 8. O despejo das 400 famílias foi realizado no dia 23 de novembro, pela Prefeitura Municipal de João Pessoa (PMJP). Desde então, as famílias estão alojadas no ginásio do Centro Profissionalizante Deputado Antônio Cabral (CPDAC), em Valentina, no ginásio da escola Hermes Taurino e na escola João Gadelha, em Mangabeira. Todos os casos confirmados são de pessoas abrigadas no CPDAC.
A informação não foi confirmada oficialmente pela PMJP, no entanto, os moradores estão adoecendo e sendo levados para a Unidade de Pronto Atendimento do bairro de Valentina. As pessoas abrigadas no CPDAC também alegam a falta de tratamento da água que eles estão utilizando da caixa d'água, fator que tem provocado dor de barriga e disenteria.
Para evitar esse tipo de situação é que os despejos foram suspensos em época de pandemia pelo Supremo Tribunal Federal. No último dia 1° de dezembro, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Luís Roberto Barroso, em resposta a pedido do Psol, Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST) e da Campanha Despejo Zero, decidiu estender a suspensão de despejos e remoções até 31 de março de 2022. Neste momento o plenário virtual do STF decide coletivamente sobre essa medida cautelar. O resultado é aguardado com expectativa.
Nesta terça (07), o Ministério Público Federal (MPF) na Paraíba publicou a manifestação da Comissão Estadual de Prevenção à Violência no Campo e na Cidade (COECV), espaço pelo qual o MPF faz parte, acerca da concessão e execução da medida liminar que resultou no despejo da Comunidade de Dubai I, no dia 23 de novembro de 2021, em João Pessoa (PB). Nela, a Comissão repudia o que chamou "violações aos direitos fundamentais das mais de 400 famílias removidas da ocupação Dubai, em João Pessoa". Para a Comissão, a "condição improvisada e precária dos alojamentos para os quais as famílias desalojadas foram levadas” demonstra a falta de planejamento para o despejo na pandemia e que tal fato é uma continuidade das violações contra a dignidade humana que as famílias de Dubai estão passando.
A COECV também lamentou não ter sido comunicada sobre a reintegração de posse das famílias da Comunidade Dubai I. "Ressalte-se que a COECV é integrada por entes estatais, do sistema de justiça e por organizações da sociedade civil, e, a despeito disso, não foi comunicada a respeito da ordem de despejo, mesmo já sendo do conhecimento das instituições apontadas", diz a comunicação da Comissão.
A Lei Estadual Lei 11.614/2019 determina que a COECV teria que ter sido avisada do despejo, antes deste ter acontecido, pois a Comissão tem como objetivo prevenir e reduzir a violência em conflitos fundiários no campo e na cidade. A COECV afirmou ter criado 2 (dois) grupos de trabalhos para "produzir relatório com os objetivos de reconhecer as violações de direitos humanos decorrentes da concessão e execução da medida liminar proferida no processo nº 0832701.66.2021.815.2001, bem como reparar os danos, punir os responsáveis e evitar a repetição de ações com o despejo da Comunidade Dubai I", diz.
Confira a seguir a Íntegra da manifestação da Comissão Estadual de Prevenção à Violência no Campo e na Cidade:
Manifestação da Comissão Estadual de Prevenção à Violência no Campo e na Cidade (COECV) acerca da concessão e execução da medida liminar que resultou no despejo da Comunidade de Dubai I, no dia 23 de novembro de 2021, em João Pessoa (PB).
Considerando que a Comissão Estadual de Prevenção à Violência no Campo e na Cidade - COECV, criada pela Lei Estadual nº 11.614-2019, nos moldes da Convenção 169 da OIT, da Lei Federal nº 8.629/1993, dos Decretos Federais nº 4.887/2003 e nº 6.040/2007, tem como objetivo mediar os conflitos fundiários no campo e na cidade, sendo obrigatória a sua notificação pela Secretaria de Estado da Segurança e da Defesa Social de requisições judiciais para cumprimento de mandados de reintegração/manutenção de posse, art. 3º da Lei Estadual nº 11.614-2019;
Considerando que, a partir da notificação obrigatória, a Comissão Estadual de Prevenção à Violência no Campo e na Cidade – COECV passa a atuar buscando alcançar soluções pacíficas nos conflitos, bem como avaliar as medidas necessárias a serem adotadas em ações possessórias coletivas e reivindicatórias, inclusive dialogando com o Ministério Público e o Poder Judiciário por ocasião do cumprimento pelo Poder Executivo de decisões judiciais de reintegração/manutenção de posse;
A Comissão Estadual de Prevenção à Violência no Campo e na Cidade, reunida em 2 de dezembro de 2021, por unanimidade dos integrantes presentes, deliberou por entender, com relação à concessão e execução da medida liminar que resultou no despejo da Comunidade de Dubai I, no dia 23 de novembro de 2021, que:
1 – A referida medida de reintegração de posse foi conduzida mediante graves violações aos direitos fundamentais das famílias atingidas, notadamente em virtude da deliberada inobservância de inúmeras normas sobre despejos nesse período de pandemia.
2– O descumprimento desse conjunto de normas sem a mediação da COECV vem gerando a continuidade das violações e atingindo a própria dignidade das pessoas removidas, pois a condição improvisada e precária dos alojamentos para os quais as famílias desalojadas foram levadas, demonstra não ter havido o planejamento prévio necessário antes do cumprimento da medida liminar.
3 – Dessa forma, a COECV lamenta que não tenha sido comunicada antes sobre a reintegração de posse das famílias da Comunidade Dubai I, a fim de buscar soluções alternativas para resolução do conflito, bem como não foi comunicada nem mesmo depois do seu cumprimento, a fim de acompanhar a situação das famílias. Ressalte-se que a COECV é integrada por entes estatais, do sistema de justiça e por organizações da sociedade civil, e, a despeito disso, não foi comunicada a respeito da ordem de despejo, mesmo já sendo do conhecimento das instituições apontadas.
4 – A COECV concluiu que a decisão liminar proferida pelo Juiz da 4ª Vara de Fazenda Pública da Capital, Dr. Antônio Carneiro de Paiva Júnior, nos autos do Processo nº 0832701.66.2021.815.2001, violou um conjunto de normas legais, notadamente:
4.1 - A decisão liminar na ADPF nº 828, sob Relatoria do Ministro Luiz Roberto Barroso, em tramitação no Supremo Tribunal Federal;
4.2 - O art. 2º, § 1º, incisos I, II e II da Lei Federal nº 14.216/2021, que proíbe expressamente a execução de qualquer reintegração, despejo, desocupação ou remoção forçada promovida pelo Poder Público (judicial ou extrajudicialmente);
4.3 - O art. 492, primeira parte, do Código de Processo Civil (Lei nº 13.105-2015), ao determinar o despejo de forma imediata, o que não foi requerido na petição inicial da ACP;
4.4 - O §1º do art. 554 do Código de Processo Civil (Lei nº 13.105-2015) ao não determinar a intimação da Defensoria Pública do Estado;
4.5 - A Recomendação nº 90/2020 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ);
4.6 - A Resolução nº 10/2018, do Conselho Nacional dos Direitos Humanos (CNDH).
5 – A COECV também entendeu por criar 2 (dois) grupos de trabalhos para produzir relatório com os objetivos de reconhecer as violações de direitos humanos decorrentes da concessão e execução da medida liminar proferida no processo nº 0832701.66.2021.815.2001, bem como reparar os danos, punir os responsáveis e evitar a repetição de ações com o despejo da Comunidade Dubai I.
6 – A COECV ressalta que a continuidade das violações acima apontadas são mais graves diante da decisão liminar na Reclamação Constitucional nº 50.470, da lavra do Ministro Alexandre de Moraes, do STF, que determinou “A SUSPENSÃO DA ORDEM DE DESOCUPAÇÃO concedida no Processo nº 0832701.66.2021.815.2001”.
7 – Por fim, a Comissão informa que no dia 1º de dezembro de 2021, o Ministro do STF, Luís Roberto Barroso, nos autos da ADPF 828/DF, prorrogou a suspensão temporária de desocupações e despejos até de 31 de março de 2022, estendendo para as áreas rurais, de acordo com os critérios previstos na Lei nº 14.216/2021, bem como determinou a intimação da União, do Distrito Federal e dos Estados da Federação, assim como da Presidência dos Tribunais de Justiça e Tribunais Regionais Federais, para ciência e imediato cumprimento da decisão.
João Pessoa, 2 de dezembro de 2021.
Comissão Estadual de Prevenção à Violência no Campo e na Cidade
Edição: Heloisa de Sousa