Paraíba

ARTIGO

A corrupção gospel do “Ministério” da Iniquidade

“As suas autoridades são pessoas revoltadas e têm amizade com ladrões. Estão sempre aceitando dinheiro e presentes"

Brasil de Fato | João Pessoa - PB |
Reprodução - Foto: Ilustrativa

Por Pastor Lenon Andrade*

 

  As suas autoridades são pessoas revoltadas e têm amizade com ladrões. Estão sempre aceitando dinheiro e presentes para torcer a justiça. Não defendem os direitos dos órfãos e não se preocupam com as causas das viúvas.

O texto em destaque foi escrito há mais de 600 anos antes da era cristã. São palavras de denúncia profética, colocadas no primeiro capítulo do livro de Isaías, onde o Profeta acusa as autoridades políticas de Jerusalém de serem eticamente decadentes, desonestas, corruptas, anti Povo e fora-da-lei. Imagino Isaías vivendo no Brasil, lendo as últimas notícias vindas de Brasília através da lente da justiça de um Deus que não suporta injustiça, sobretudo, quando praticadas contra os mais vulneráveis da sociedade...

Salta aos olhos a constatação da semelhança daquela realidade com a nossa, especialmente quando percebemos que o Profeta se dirige às lideranças políticas e religiosas da capital, que se apresentavam ao Povo como servos zelosos da religião e dos ritos sagrados, denunciando a mentira que praticavam em nome de Javé para roubar e enriquecer às custas do povo sofrido!

No Brasil de mais meio milhão de vidas perdidas, vítimas da covid19, o nome de Deus é tomado em vão para justificar todo tipo de perversidade contra o Povo brasileiro! Mercenários religiosos se apropriaram do sublime título pastoral para se associarem a ladrões com o fim de encherem o bolso com dinheiro público.

Esbanjando cinismo e hipocrisia, a trupe mercenária, associada ao falso messias que ocupa o palácio, legitima o culto a um ídolo, elevado pelo chefe da trupe como deus acima de todos, em absoluta rota de colisão com o Evangelho de Jesus de Nazaré, este anunciado por toda a tradição profética da Bíblia como Deus feito gente, vivendo entre nós, sendo um de nós, que se reconhece nos mais pobres e vulneráveis do Povo.
 
O deus acima de todos da religião bolsonarista é um ídolo que, à semelhança do deus cananeu Molok dos tempos bíblicos, exige sacrifício humano para compensar a sede de poder e riqueza de seus sacerdotes e adoradores. Na lógica dessa religiosidade política doentia, a vida das pessoas não tem valor algum, pelo contrário, é solenemente descartada por essa gente iníqua, empoderada por uma elite asquerosa e sem noção, em conluio com uma parcela significativa de políticos, igualmente sem noção, que usam o parlamento para se apropriarem do erário através de malabarismos desonestos como é o caso do orçamento secreto. É nesse cenário, de destruição da nação, em nome de deus, que se manifesta o ministério da iniquidade!

A essa altura alguém deve estar se perguntando, porque tantas citações bíblicas? Simples. A Bíblia tem sido tão usada para legitimar a podridão gerada nos porões do poder que é preciso trazê-la de volta ao seu lugar de legitimidade, um lugar sublime que é a defesa intransigente da dignidade humana! Essa é a principal mensagem das Escrituras Sagradas: Deus ama tanto o ser humano e o mundo criado por Ele que é capaz de viver, morrer e ressuscitar pelo sublime alvo do seu amor, tornando sagrados o humano e toda a criação. Tudo o que atenta contra esse amor, toda ação política atentatória à vida humana e ao planeta é contra Deus, é anticristo, portanto anti vida. É manifestação do ministério da iniquidade.

Na Bíblia, Ministério é serviço generosamente prestado em benefício do bem comum, conforme ensina o apóstolo Paulo na sua carta aos Coríntios, no capítulo 12. Assim, a Política que significa a arte do bem comum, na definição clássica, guarda profunda relação com o ensino bíblico sobre as relações que devem prevalecer na vida em sociedade, onde todos devem ser valorizados em suas competências e habilidades para contribuírem com a coletividade, naquela perspectiva do Ubuntu africano, onde a solidariedade e o respeito à dignidade do outro são a base das relações comunitárias. Quando essa ética é quebrada, motivada pelo preconceito, pelo desejo cego de poder, pela busca sem noção da riqueza, pela inflação do ego autoritário, pelo uso da força contra o mais fraco e, finalmente, pelo terrorismo de Estado, aí então a maldade prevalece como ação política do Estado e dos grupos sociais que apoiam a barbárie. É isso que está acontecendo nos Ministérios de Brasília, agora transformados em covis de ladrões e salteadores do dinheiro público.

Este texto foi escrito para ser ação profética de denuncia das injustiças que ocorrem em nosso país e, ao mesmo tempo, anúncio da justiça fundada naquele Amor que deseja a cura do tecido social doente. Mas, para que isso ocorra, é preciso arrependimento radical, mudança da mente, mudança da cultura da exclusão para a cultura da inclusão de todos, a começar pela pleno resgate da dignidade dos 31 milhões de brasileiros que estão passando fome. Enquanto isso não acontecer, a denúncia profética permanecerá! 

“Quando vocês levantarem as mãos para orar, eu não olharei para vocês. Ainda que orem muito, eu não os ouvirei, pois os crimes mancharam as mãos de vocês. Lavem-se e purifiquem-se! Não quero mais ver as suas maldades! Parem de fazer o que é mau e aprendam a fazer o que é bom. Tratem os outros com justiça; socorram os que são explorados, defendam os direitos dos órfãos e protejam as viúvas.”
(Isaías 1,15-17).

*Pastor Lenon Andrade é membro do Centro Ecumênico de Estudos Bíblicos (CEBI) e co-pastor da Comunidade Batista do Caminho em Campina Grande PB.
 

Edição: Cida Alves