Paraíba

CULTURA POPULAR

Projeto de Salvaguarda do Cavalo Marinho de Bayeux retoma suas atividades nesta sexta (13)

Nos encontros têm ensaios, performances musicais (rabeca, pandeiro, recos e ganzá), canto, dança, teatro e brincadeiras

Brasil de Fato | João Pessoa - PB |
Reprodução - Card: Reprodução

O projeto Salvaguarda Emergencial do Cavalo Marinho do Mestre Zequinha (Bayeux/PB) retorna às suas atividades na próxima sexta-feira (13/01), na praça Vereador Franco, em Bayeux. Os encontros acontecerão todas as sextas-feiras, de forma gratuita, das 19h às 21h.

Com início em outubro passado, o projeto entrou em recesso em dezembro, e estará retomando as atividades neste dia 13, com pausa agendada apenas para julho. 

Além dos encontros com ensaios e performances musicais (com rabeca, pandeiro, recos e ganzá), canto, dança, teatro e brincadeiras, haverá oficinas de toque de rabeca e de construção de rabeca.

A oficina de toques de rabeca será ministrada por Pedro da Rabeca, natural de Pedras de Fogo. E a oficina de construção de rabeca será ministrada por Leandro Silva, mestre Luthier oriundo de Nazaré da Mata (PE), mas que está habitando a capital há alguns anos.


Mestre Pirralhinho ensinando sobre a figura do Velho Frio / Foto Arquivo Pessoal

O projeto tem produção de Arthur Costa e Alan Monteiro, integrantes do Grupo Boi da Praça, que é um grupo de estudo em Cavalo Marinho e Boi de Reis na Paraíba, atuando desde 2017.

“A gente está ajudando a produção dessa salvaguarda do cavalo marinho do mestre Zequinha, visto que o grupo está parado desde a morte do mestre, em 2012. De lá para cá, o grupo estava parado por questões de desarticulação. E com o projeto, estamos tentando levantar esse cavalo marinho novamente, com recursos para reestruturar todo o material do grupo, desde as roupas até as figuras da armação, que são: a burra, o bode, o cavalo, o Jaraguá, a Macaíra, o boi, os trajes e as coroas. Então temos um recurso para isso, e também para fazer o financiamento dos oficineiros que são pessoas que ficam lá para, de alguma forma, ajudar o andamento do projeto”, explica Arthur Costa.


Seu Luiz botando a figura do cavalo / Foto Arquivo Pessoal

Todas as ações durante os encontros são conduzidas pelo mestre Nandinho, herdeiro cultural do mestre Zequinha.

“Quando o mestre Zequinha faleceu, entregou esse grupo na mão de mestre Nandinho, o qual hoje é o responsável por levar essa história do Cavalo Marinho de Bayeux e ensinar essa forma de brincar. Então ele é uma pessoa fundamental nesse processo. É ele quem está entrando em contato com os brincadores antigos para que as pessoas possam estar presentes e se envolverem com seus conhecimentos e sua sabedoria em torno da brincadeira”, enfatiza Arthur.


Dia da vivência com o Mestre Pirralhinho  / Foto Reprodução

“Eu sempre dizia em palestras que o folguedo cavalo marinho sempre foi muito importante, mas os órgãos públicos não perceberam tanta importância desse valor até hoje. Foi aqui foi onde começou o cavalo marinho boi de reis que é o que praticamos, porque o da zona da Mata é diferente do nosso”, conta o Mestre Nandinho.

Em processo constante de reestruturação com a dissolução do grupo após a morte do mestre Zequinha, por enquanto ainda poucas pessoas têm ido com periodicidade. 


Mestre Pirralhinho e uma criança / Foto Arquivo Pessoal

“Algumas pessoas estão indo, mas há várias que ainda não. E tem algumas pessoas de Bayeux que ainda estão começando a participar, então é uma coisa muito incerta em termos de quantidade de participantes, que oscila bastante porque, como é numa praça, às vezes vão 10 pessoas, às vezes não vai quase ninguém, e às vezes vão 15 pessoas…”


Figura do boi esperando para entrar na brincadeira / Foto Arquivo Pessoal

Brincadeiras que se misturam

A diferença entre as brincadeiras de cavalo marinho e boi de reis nem sempre fica evidente. A razão para isso é que, no passado, existiram muitos mestres de cavalo marinho e bois de reis, e assim, as brincadeiras foram se misturando. As variações ficam um pouco mais salientes quando se penetra no miolo do Estado.


Mestre Luiz Cirandeiro entoando os aboios numa vivência para o grupo / Foto Arquivo Pessoal

“No brejo, encontramos várias diferenças para a brincadeira dos grupos de bois de reis e cavalo carinho com a região metropolitana. Quando vamos para a zona da mata também há várias diferenças do cavalo marinho de lá para cá. Então, o Grupo de Estudos Coco Acauã realizou a ‘I Pisada de Cavalo Marinho, Boi de Reis e Reisado da Paraíba’, um evento muito importante em que tivemos a oportunidade de trazer referências culturais dessas três brincadeiras”, conta Arthur.

“Eu sempre achei que a gente precisa ser reconhecido aqui em Bayeux porque daqui vão sair os futuros brincantes e mestres, então não adianta você ser reconhecido lá fora, mas não na sua comunidade. Mas o Mestre Gasosa adotava isso, que você deve ser conhecido lá fora, e eu discordo disso dele”, comenta Mestre Zequinha

::CULTURA POPULAR | I Pisada de Cavalo Marinho, Boi de Reis e Reisado da Paraíba acontece neste sábado (16)

Registros escassos

Apesar de contar com uma incidência de mais de 100 anos de atuação no estado, a brincadeira sofre com dificuldades marcantes. Uma delas diz respeito à pesquisa escassa, além do pouco registro documental.

“A brincadeira aqui na Paraíba tem pelo menos 100 anos, e eu afirmo isso porque conheci um mestre chamado Zé Hermínio Caeira, que é oriundo de um lugarejo chamado Lagoa do Padre, na região de Riachão do Poço, e que faleceu com quase 100 anos, mas quando era adolescente já existia a brincadeira”, explica Arthur.


Mestre Luiz Cirandeiro botando a figura do vaqueiro / Foto Arquivo Pessoal

O estado de Pernambuco no entanto saiu à frente nesse quesito. O IPHAN (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) acolheu um inventário de referências culturais do cavalo marinho, através da mediação e realização de uma associação local, que resultou no reconhecimento exclusivo do cavalo marinho de Pernambuco com o título de Patrimônio Cultural Imaterial do Brasil, em 2014.

O cavalo marinho paraibano ficou negligenciado, e até hoje não existem políticas públicas voltadas para essa expressão. A ajuda financeira que aparece para os mestres e brincantes se dá quando alguma prefeitura os convida para realizar o espetáculo - o que vem sendo cada vez mais difícil de acontecer.

“A gente está tentando demarcar esse território mesmo, e é por isso que a gente vem com essas pautas de instituição do dia estadual e o dia municipal, e também o reconhecimento como patrimônio cultural imaterial do estado”, assegura Arthur Costa.

Mestre Luiz Cirandeiro botando a figura dodoutor da medicina / Foto Arquivo Pessoal

Mestres visitantes

O projeto de Salvaguarda do Cavalo Marinho de Bayeux já contou com a presença do Mestre Pirralhinho, (Boi de Reis Estrela do Norte, de João Pessoa), Mestre Totonho e Mestre Luiz Miguel (Boi de Ouro, de Pedras de Fogo - ambos são de Itambé/PE mas tocam em um cavalo marinho da Paraíba) que é de onde vem o mestre mais antigo em atividade, Seu Araújo, com 100 anos de idade.

Também houve a presença do Mestre Luiz Cirandeiro (de São Miguel de Taipu/PB) - lá também o cavalo marinho está parado há mais de 30 anos, e também teve origem em Bayeux, com o Mestre Raul.

A presença da Mestra Tina do Cavalo Marinho Infantil Sementes do Mestre João do Boi (Bairro dos Novais) é constante. Ela é a única Mestra de cavalo marinho da Paraíba. 

“À medida que vamos pesquisando, a gente percebe que são muitos mestres que já se foram. Hoje têm poucos vivos para contar essa história, mas conseguimos encontrar, ouvimos nomes de mestres em toda extensão do estado”, explica Arthur.

Em Pedras de Fogo, Seu Araújo (que também é Mestre de Mamulengo e artesão) foi homenageado como o mestre mais antigo, como ‘Patrimônio Vivo’ de Pedras de Fogo, em abril de 2022.

“O Cavalo Marinho pra mim é uma distração, uma distração muito boa. Pra mim, é a melhor distração que tem. Sou acostumado a brincar ele desde garoto e ainda hoje eu gosto de brincar. Eu sou chegado a um Cavalo Marinho”, disse Seu Araújo em uma publicação do Conexão Cavalo Marinho.

Realização do Projeto de Salvaguarda 

O projeto de Salvaguarda do Cavalo Marinho de Bayeux surgiu através de um TAC (Termo de Ajustamento de Conduta) firmado entre o IPHAN e a empresa Alphaville Bayeux. A razão da participação da empresa no projeto foi por um acordo entre o IPHAN e a Alphaville por questões ambientais, e a maneira encontrada de solucionar foi injetando recursos na cultura local. O IPHAN atua como fiscalizador do projeto, observando o andamento e a sua execução.

 


 

Edição: Maria Franco