A morte do dramaturgo José Celso Martinez Corrêa, o Zé Celso, deixou em luto a cultura brasileira. Logo após a confirmação do falecimento, na manhã desta quinta-feira (6), artistas paraibanos se manifestaram em pesar pela perda do ícone do lendário Teatro Oficina.
‘Uma tristeza imensa saber da notícia da morte de Zé! Zé era certamente uma encarnação de Dioniso. Assim como o Deus, Zé partindo, fica sua irreverência. Um espírito revolucionário sempre lutando contra a Ditadura, não apenas a monstruosa militar, mas a da sociedade também. Era inimigo da caretice geral. Farto de utopias, não se rendeu à comercialização de sua arte. No Oficina construiu uma história dos deuses cheio de discípulos. Banhando com vinho seu teatro apaixonado, absolutamente comprometido com a democracia e a liberdade. Uma encarnação do Deus Baco desencarna hoje, mas sua história continuará viva para sempre! Evoé’ - Suzy Lopes, atriz.
‘Eu conheci Zé Celso, acho que 2008 ou 2009 no Rio de Janeiro, através de um amigo em comum, o ator Silvio Guindane. E Silvio estava no processo de inauguração de um espaço cultural, e na inauguração desse espaço iria ter uma oficina de teatro feita por Zé Celso, foram três dias intensos, e eu fui convidado para registrar em vídeo essa oficina. Espero que esse material ainda esteja com Silvinho.
Participaram dessa oficina vários atores e atrizes como, Mariana Ximenes e Maria Padilha. Sem contar com a participação especial da grande atriz e preparadora de elenco, Camila Amado (In memorian), a qual também tive a honra de ser preparado por ela na ocasião da minha participação no filme “5X vezes favela - agora por nós mesmos. Então, foram três dias intensos, onde pude sentir aquela energia boa do Zé, no final da oficina teve uma festa na casa da atriz Maria Padilha, e o que eu fiquei assim, abismado, foi ver o Zé Celso, tocar piano praticamente a noite toda, cantando e ainda fazendo exercícios com a gente. E o que eu jamais vou esquecer era todo mundo abraçado girando e cantando “Atuar para poder voar”. Essa é a lembrança que Zé Celso me deixou, o que me foi muito positivo é muito enriquecedor, tanto como pessoa como para minha carreira. Zé Celso, um xerooooooooo (BQ)’ - Beto Quirino, diretor e ator.
‘Zé Celso é estrela de primeira grandeza! Artista e cidadão absolutamente libertário. A presença dele ao longo da sua vida é de uma extraordinária inspiração para todas as pessoas. O cidadão artista, o artista cidadã indissociável! Quanta beleza gerada no palco e no cotidiano da vida! Evoé!’- Buda Lira, ator.
'Essa foto foi feita no dia 7 de outubro de 2017, às 22h51, em frente ao Theatro Santa Roza, após uma brilhante e dionisíaca Aula Magna de Zé Celso Martinez na abertura da 1ª Mostra de Artes Teatrais Integradas. Junto conosco está uma linda jovem, cujo nome não me lembro, mas que Zé Celso achou "a cara da Norma Bengel!". Hoje esse Xamã do Teatro mundial, que foi resistência durante a ditadura e o neofascismo da direita bolsonarista, ascendeu ao Olimpo, onde vai ser potência e subversão nos palcos etéreos. Que sorte imensa nós brasileiros temos de ter tido por tanto tempo um artista genial e revolucionário como Zé Celso Martinez Corrêa, que influenciou e ajudou a construir várias gerações de atores e atrizes! De tão ousado e visionário, ele estava, como bem colocou O Zeca Camargo , séculos à frente! Como todos os xamãs, entidades, deusas e deuses do Teatro e das Artes, Zé Celso é imortal! Evoé!' - Sandro Alves, jornalista e escritor.
'A partida de Zé Celso neste momento encobre nosso céu já nublado com uma chuva torrencial de lágrimas. Chorar é nossa única opção diante de tamanha perda. O gigante ‘José Celso Martinez Corrêa deixa um grande vazio no trono do teatro brasileiro. Ao mesmo tempo, sua grandiosidade nos preenche com um inestimável legado de ousadia, alegria e criatividade. O corpo de Zé Celso nos deixa mas o seu teatro fica, fica em cada artista deste país comprometido com a busca pela mudança, comprometido com a inquietação criadora, marca deste grande homem e dramaturgo. Suas ideias já são parte de cada palco desde Brasil e jamais deixarão vazios os nossos corações. Viva Zé Celso. Evoé!’ - Cely Farias, atriz e diretora.
‘Zé Celso foi meu Guru, vivi no teatro Oficina, onde assisti várias vezes ‘Pequenos Burgueses’ e tenho aquela montagem como uma tese, como minha cátedra, minha escola. Hoje chorei muito com sua partida e a sua lembrança será eterna em mim’ - Fernando Teixeira, ator, dramaturgo e diretor.
'Pois é, foi embora a nossa referência revolucionária dos palcos, a nossa referência da contra-cultura teatral, a vanguarda antropofágica das artes cênicas. O teatro se foi também. Ficam só o mercado e as lições dionisiacas/ritualisticas do mestre Celso.' - Everaldo Vasconcelos, professor, dramaturgo, diretor de teatro e televisão, ator e poeta.
‘Louco e visionário! Uma lenda do fazer teatral! O teatro que questiona sem amarras as estruturas dos poderes dominantes vigentes. O teatro que esfacela a linha divisória entre plateia e público. Uma plasticidade lúdica sem deixar de mostrar a crueza/a crueldade da vida não-cênica. Um grande mestre que me inspirou (e continuará inspirando) em minhas próprias produções. Evoé, Zé Celso!’ - Antonio Deol, diretor de teatro.
Na Paraíba, uma 'Aula Magma'
Zé Celso esteve na Paraíba em 2017 para a abertura da Mostra Marte, evento sob Patrocínio Cultural da Caixa Econômica Federal, realizado pela Associação de Atores Dupla Face, no período de 07 a 14 de outubro de 2017, e curadoria de Nilton Santos (diretor de teatro) juntamente com Valmir Santos (jornalista da Folha de São Paulo).
A mostra contou com várias apresentações de teatro, dança e performances e Zé Celso realizou uma aula espetáculo chamada ‘Aula Magma’ (nome com referência à lava do vulcão).
“Para ele, o teatro tinha um poder semelhante, forte igual a lava de vulcão, quente e que, querendo ou não, quando tocava as pessoas, feria e petrificava, guardando resultado de tensão emocional, do que é bom e do que ao mesmo tempo tem a possibilidade de purgar, como a própria catarse do teatro, isso era palavra que ele dizia durante a aula magma”, conta Nilton Santos.
“Nessa aula, ele quebrou totalmente a concepção de uma aula espetáculo, ele movimentou a plateia e colocou-a no palco, tirou das poltronas e colocou nos camarotes, todos em pé. Depois fez um coro semelhante ao que acontecia no teatro grego, e ele fez o papel do Corifeu, que seria um Mestre de Cerimônia no teatro grego, e fazia com que todo o coro cantasse. E cantou algumas músicas que foram utilizados pelo Teatro de Oficina ao longo da sua história, falou de alguns movimentos que são movimentos dionisíacos, que faz o ator potencializar a respiração - o ator encontrar de fato uma energia verdadeira, não falsa, e ele falava nessa aula magma que o teatro deve se inspirar nas escolas de samba, nos terreiros de Candomblé. E nós, do Brasil, deveríamos fugir ao máximo dessa ideia eurocêntrica de arte e buscar a nossa própria referência, dos terreiro, dos Quilombolas e, sobretudo, das escolas de samba, as quais ele dizia que talvez fosse a nossa grande culminância do teatro brasileiro”, complementa Nilton.
Edição: Cida Alves