Os organizadores do Congresso Consciência Cristã, evento proeminente no cenário religioso brasileiro, surpreenderam ao anunciar o pastor norte-americano Douglas Wilson como palestrante principal. O evento está agendado para fevereiro em Campina Grande (PB), em pleno carnaval, e é previsto atrair além de lideranças conservadoras religiosas, também lideranças da direita brasileira.
Teólogo fundamentalista, autor de dois livros para defender a escravização de pessoas negras por cristãos, o pastor já exerce grande influência na extrema direita brasileira. Suas ideias remontam à década de 1960, marcada por uma reação contra o movimento pelos direitos civis nos Estados Unidos. Influenciado por teólogos como Robert L. Dabney e Rousas Rushdoony, que defendiam o sistema escravista do sul dos EUA, Wilson sustenta a tese de que a escravidão teria sido positiva se seguisse princípios bíblicos.
Ele argumenta que a vitória dos abolicionistas impediu africanos escravizados de encontrar "mestres piedosos" nos Estados Unidos, levando-os a destinos como Haiti e Brasil, onde, segundo ele, as condições eram piores.
Essa abordagem revisionista do passado escravista é central nos trabalhos acadêmicos de Wilson, que buscam "tirar o estigma" do sistema escravista do sul dos Estados Unidos. Ele chega a afirmar que, seguindo a visão do teólogo confederado Dabney, os maus tratos aos escravizados eram raros e pouco frequentes, contrariando amplamente a historiografia convencional.
Considerado seu panfleto ‘Southern Slavery, As It Was (Escravidão do Sul, como era) , que ele co-escreveu com o ministro cristão J. Steven Wilkins chegam a dizer que “a escravidão produziu no Sul um afeto genuíno entre as raças que acreditamos poder dizer que nunca existiu em nenhuma nação antes ou depois da guerra ”.
Além de suas visões controversas sobre escravidão, Wilson é um defensor incondicional do nacionalismo cristão nos Estados Unidos. Ele endossou declarações polêmicas do ex-presidente Donald Trump, incluindo a equiparação do movimento Black Lives Matter à Ku Klux Klan. Essa associação ao nacionalismo cristão é vista por muitos especialistas como uma ameaça à democracia nos EUA, especialmente após os eventos no Capitólio em janeiro de 2022.
A escolha de Douglas Wilson como palestrante principal do Congresso da Consciência Cristã levanta questionamentos sobre a direção ideológica e possíveis implicações no cenário político brasileiro. Nesta perspectiva, a presença de Wilson permite uma "defesa aberta da naturalização da escravidão".
A ligação do nacionalismo cristão aos eventos no Capitólio em janeiro de 2022 nos EUA e no ataque às sedes dos três poderes em Brasília em janeiro de 2023 é uma preocupação real. A visão de Wilson de que o nacionalismo cristão é uma "resposta cristã" às atuais questões sociais sugere um desejo de influenciar as escolhas morais da sociedade em linha com suas interpretações religiosas, o que pode representar um desafio à diversidade ideológica e à própria democracia.
Segundo Almir Aguiar, secretário de Combate ao Racismo da Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro (Contraf-CUT), “esse não é um sentimento cristão. O cristianismo defende que todos respeitem o próximo sem qualquer discriminação. A Constituição e o Código Penal proíbem o trabalho escravo no Brasil, portanto as palavras desse pastor norte-americano são ilegais aqui”, complementa.
O crime de racismo é imprescritível, com pena de dois a cinco anos de prisão
“Defender a escravidão no Brasil é um disparate, até porque nós, os negros e as negras, somos 57% da população. No entanto, o pior de tudo é que esse pensamento é racista em sua essência, e nenhum tipo de discriminação tem espaço numa sociedade justa e democrática, como a que estamos buscando construir no Brasil”, afirma o secretário.
Além disso, o Prefeito Bruno Cunha Lima proibiu o carnaval em espaços públicos de Campina Grande (PB), reservando áreas centrais e bairros da cidade exclusivamente para o Congresso Consciencia Cristã. De acordo com Marcel Joffily, defensor público que atua em Campina Grande, a proibição é inconstitucional, independente do Termo de Compromisso e Ajustamento de Conduta (TAC) firmado com o Ministério Público da Paraíba, em 11 de janeiro de 2024. “O Estado é laico, não podendo, sob uma pretensa organização de espaços, privilegiar grupos religiosos em prejuízo de outros”, enfatiza Marcel.
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Edição: Cida Alves