Na última quinta-feira (22), uma liminar, expedida pela juíza Luciana Celle, da 4ª Vara da Fazenda Pública da Capital, decidiu que a Secretaria de Planejamento da Prefeitura de João Pessoa (Seplan/PMJP) deve conceder a Licença de Habitação (Habite-se) para um prédio da Construtora Cobran (Brascon), construído acima da altura permitida por lei.
O 'habite-se' é a liberação para que as chaves dos imóveis sejam entregues aos moradores e o prédio possa ser habitado. A Procuradoria-Geral do Município de João Pessoa vai recorrer à decisão junto ao Tribunal de Justiça do Estado da Paraíba. O Ministério Público da Paraíba (MPPB) também vai ingressar com ação contra a medida liminar.
“Pela legislação municipal, só quando existe o pedido de expedição da carta de habite-se é que a prefeitura vai ao local da obra para fiscalizar e fazer a medição, a fim de saber se ela foi feita de acordo com o alvará de construção. E, foi nesse momento, quando a construtora pediu o habite-se, que o setor da Seplan constatou a irregularidade”, explica Bruno Nóbrega, procurador-geral do município de João Pessoa.
O empreendimento Way fica localizado na Avenida Epitácio Pessoa, entre Tambaú e Cabo Branco, e está a 50 metros da orla. De acordo com a Seplan, a altura máxima permitida para edificações, naquele local, é de 23,41 metros e essa edificação da Construtora Brascon tem 28,50 metros.
“É necessário que se tenha na lei um desenho que traduza as informações em relação a essas alturas máximas na nossa orla paraibana, porque a falta de transparência dá margem a manobras, a desobediências, a subterfúgios e a atos de corrupção, com relação a agentes públicos e às construtoras”, enfatiza Marco Suassuna, arquiteto e urbanista.
No Município de João Pessoa, existe a Lei Nº 1.347, de 27 de abril de 1971, que institui o Código de Obras da Cidade. O artigo 105 estabelece que “Requerido o ‘habite-se’ a Diretoria de Fiscalização de Obras providenciará a vistoria da edificação”. Essa foi a mesma lei utilizada pela juíza Luciana Celle para conceder o pedido de liminar, requerido pela Brascon. Nos autos do processo, a construtora afirma que “sem motivo jurídico algum a autoridade coatora se omite ao não expedir a Licença de Habitação (Habite-se) do empreendimento Way”.
Entretanto, o artigo 229 da Constituição do Estado da Paraíba, proíbe a construção dos chamados espigões - grandes edifícios. "A zona costeira, no território do Estado da Paraíba, é patrimônio ambiental, cultural, paisagístico, histórico e ecológico, na faixa de quinhentos metros de largura, a partir da preamar de sizígia para o interior do continente, cabendo ao órgão estadual de proteção ao meio ambiente sua defesa e preservação, na forma da lei”, infere o artigo. Em alínea, o artigo 229 especifica que “nas áreas já urbanizadas ou loteadas, obedecer-se-á a um escalonamento de gabaritos a partir de doze metros e noventa centímetros, compreendendo pilotis e três andares, podendo atingir trinta e cinco metros de altura”.
A determinação da juíza se deu através de um pedido de mandado de segurança, impetrado pela Brascon, contra o município e a Diretoria de Controle Urbano da Secretaria de Planejamento de João Pessoa. A decisão se baseia em um alvará concedido, para o empreendimento Way, pela prefeitura, em 2019 (ainda na gestão de Luciano Cartaxo) e comenta que “não há registro nos autos de qualquer comunicação de embargo da obra, ou seja, a municipalidade permitiu a conclusão da obra sem embargo, logo, considerando que a construção seguiu o projeto aprovado, a recusa do habite-se é injustificada”.
De acordo com os autos do processo, o Município de João Pessoa alega que “a não concessão do habite-se tem origem no evento anterior: o alvará de construção. Este foi expedido pelo responsável pela Diretoria de Controle Urbano em 02 de dezembro de 2019, mesmo após constatada uma altura superior à permitida. Tal decisão foi justificada pelo fato de existir um prédio com o mesmo gabarito, mais próximo da orla”.
Conforme o documento da decisão, João Pessoa declara que o MPPB “instaurou inquéritos civis para apurar responsabilidades pela construção de prédios na faixa de orla com altura superior ao permitido, sendo esta, portanto, a principal irregularidade que aflige o empreendimento da impetrante”. Assim, o Município, pode sofrer crime de responsabilidade, caso dê continuidade à construção.
Levando em consideração esse fato, a juíza Luciana Celle pondera, apesar da sua decisão de ter sido favorável à Brascon, que caso seja constatado que a licença foi dada por erro de um servidor, “o município deve utilizar os meios disponíveis para revogar as licenças e/ou iniciar uma ação demolitória, se necessário”.
Cláudia Cabral, promotora de Justiça do MPPB, que atua na área de defesa do meio ambiente e do patrimônio social de João Pessoa, informa que o Ministério Público só tomou conhecimento do caso nessa terça-feira (27), quando o processo da 4º Vara da Fazenda Pública, se tornou público.
“Nós estamos avaliando, tomando conhecimento dos autos. Já analisamos a liminar e, obviamente, por discordar dos seus fundamentos, eu, 43ª promotora de defesa do meio ambiente da Capital, e o promotor titular que atua perante a 4ª Vara, Francisco Seráphico Ferraz, assinaremos em conjunto a peça recursal e vamos levar o caso, através do agravo, para conhecimento Tribunal de Justiça, buscando a revogação dessa medida liminar. Ressalto que a atuação do MPPB é para cumprimento da Constituição do Estado da Paraíba, em seu artigo 229”, frisa a promotora, por meio da assessoria do MPPB.
A promotora informa também que "no final do ano passado, chegou uma denúncia [sobre esse empreendimento] via a Ouvidoria do Ministério Público. O procedimento respectivo foi instaurado e encontra-se em sede de instrução".
Impactos dos espigões
Segundo Paula Frassinete, bióloga e presidente da Associação Paraibana Amigos da Natureza (Apan), organização criada em 1978, os três efeitos mais graves que os 'espigões' já causam nos lugares que existem como São Paulo, Rio de Janeiro, Fortaleza (CE), e causariam em João Pessoa, são a diminuição da ventilação, impedimento do aquecimento da areia, pois iria existir a sombra dos prédios em determina hora – promovendo a umidade e o aparecimento de fungos, por exemplo – e a possível construção de emissários submarinos.
O arquiteto e urbanista Marco Suassuna evidencia que apesar do problema ter relação, em certa medida, com a ventilação da cidade, o problema se trata, principalmente, da preservação da paisagem. “A paisagem é um patrimônio coletivo, social e tem um significado muito grande em relação a nossa cidade [João Pessoa]. Se a gente deixar que ocorra como em Balneário Camboriú (SC), Recife (PE), a gente vai estar comprometendo o nosso patrimônio”, explana.
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Edição: Heloisa de Sousa