A questão ambiental, para nós, deve ser um eixo estruturante do nosso desenvolvimento
Por Roberto Jefferson Normando*
Olhar a conjuntura
O ano de 2024 será marcado pelas disputas político-eleitorais para o executivo e parlamento municipal, de muito debate sobre a realidade dos municípios e de articulações e alianças políticas diversas. Muitas destas coalizões nem sempre levam em conta os reais problemas da população, nem estão comprometidas com as possibilidades de construção de plataformas locais de governança democrática.
O mundo passa por uma conjuntura dos extremismos com o avanço da extrema direita e dos conflitos bélicos, o que tem acentuado desigualdades, opressões e discriminações… No Brasil, a extrema direita foi derrotada no âmbito eleitoral em 2022, mas segue viva em suas estratégias, em articulações no âmbito internacional e na mobilização de suas bases. Em 2024, buscará continuar crescendo a partir da conquista de um maior número de prefeituras e assentos nos parlamentos municipais. Por outro lado, o nosso campo progressista segue com o desafio de governar o Brasil para ampliar e fortalecer a democracia, gerando um novo ciclo econômico de prosperidade comprometido com as justiças social e ambiental.
Uma das tarefas fundamentais do debate sobre as cidades na atual conjuntura é o de recuperar o espaço democrático, o espaço público da divergência, dos projetos políticos ideológicos diferentes, mas numa disputa radicalmente democrática e sem o ódio como o elemento de negação e mesmo destruição do outro/a. Aqui cabe refletir que somos uma sociedade diversa, fraturada por desigualdades e repleta de contradições. É possível recuperar um ambiente civilizatório e democrático neste contexto?
Se queremos de fato questionar o modelo do espaço urbano que temos hoje em nossos municípios, temos que falar de qual modelo econômico rege nosso desenvolvimento e nossa organização societária. É pelo resultado do modelo econômico que reconhecemos uma cidade de bem-estar para todos/as ou uma cidade que segrega e concentra riqueza.
E Campina Grande?
Falando de uma Agenda Urbana para Campina Grande, logo vem a pergunta: qual Campina Grande temos? Qualquer projeto político que queira ser vencedor para melhorar a vida das pessoas, precisa mergulhar na realidade, para conseguir entender e propor soluções de curto, médio e longo prazo. Uma realidade diversa e complexa. Temos uma Campina Grande conhecida e reconhecida como uma das principais cidades do Nordeste. O município passou por fases importantes de desenvolvimento econômico como o ciclo do algodão e da industrialização e foi reconhecida, também, como a capital do trabalho e pela expansão do polo educacional, tornando-se um espaço promissor da inovação tecnológica e científica. Porém, ao mesmo tempo, é uma cidade profundamente contraditória e desigual.
É suficiente uma andança pela cidade para se deparar com as realidades de exclusão e injustiças social e ambiental; infraestrutura precária, áreas de favela e de riscos e uma periferia crescente em toda zona urbana, sem falar da área rural e dos distritos, com vários problemas de aumento da pobreza; a falta de cuidado e preservação das suas nascentes, rios, das áreas verdes, o descompromisso total com o meio ambiente e a falta de políticas diante da urgência das mudanças climáticas. O mundo do trabalho encolheu no município, aumentando a informalidade, o emprego precário e o baixo nível de rendimento das famílias campinenses. Além disso, o aumento da população em situação de rua é evidente. Basta olhar os dados do censo de 2022, para constatarmos uma Campina Grande profundamente desigual e estagnada economicamente.
Uma cidade para a justiça social e ambiental, eis a Agenda
Somos uma cidade do semiárido do Nordeste brasileiro, com um histórico de crise hídrica. A questão ambiental, para nós, deve ser um eixo estruturante do nosso desenvolvimento. Portanto, para agenda municipal, é importante priorizar: políticas que promovam a produção descentralizada de energias renováveis, com atenção aos seus impactos sociais e ambientais; a correta captação da água das chuvas, incentivando a difusão de tecnologias sociais; o saneamento ambiental a partir de uma abordagem multidimensional integrada; o reflorestamento, cuidado e revitalização das nossas nascentes, rios e canais; o necessário cuidado com as áreas de risco, a partir de planos participativos de prevenção. Passa aqui, também, a política habitacional, a reurbanização de favelas e tantas outras iniciativas tão necessárias nestes tempos de mudanças climáticas que intensificam os desastres, tendo a periferia como prioridade absoluta e central de toda a agenda urbana.
Não há como efetivar o direito à cidade, sem o pleno direito e efetivação de uma democracia econômica. Ou seja, uma cidade onde o trabalho, a renda, os interesses do capital, devem estar na mesa e na construção de políticas públicas econômicas que tenham como centro a igualdade de oportunidades para todas as pessoas. Falar de política urbana, é e deve ser falar de economia local e global.
As legislações a exemplo do Plano Diretor, dos Planos Setoriais e Temáticos, como também os espaços de participação dos conselhos, conferências, audiências públicas são de grande importância e devem fazer parte de um compromisso democrático de uma gestão que esteja conectada com os interesses da população. Mas sem uma sociedade civil fortemente organizada e articulada, esses instrumentos não ficam de pé e a participação cidadã nos espaços institucionais se precariza e perde qualidade e capacidade de influenciar os rumos.
Iniciativas como a “Frente pelo Direito à Cidade”, articulada desde 2018, que reúne organizações sociais, grupos de pesquisa das universidades, observatórios, sindicatos e ONGs que vêm discutindo e mobilizando uma Agenda Urbana tendo como centro a redução das desigualdades, a participação plural nos rumos da cidade e o fortalecimento da sociedade civil organizada pelo direito à cidade, devem ser fortalecidas e aprimoradas.
No enfrentamento a esses e tantos outros desafios, a retomada da revisão do Plano Diretor é extremamente importante para que a cidade enfrente as suas próprias contradições e desigualdades, com o apontamento de saídas à médio e longo prazo, permitindo um planejamento exequível expresso na síntese das prioridades definidas pela população para o presente e o futuro da cidade.
São muitos os desafios para construirmos uma Campina Grande social e economicamente justa, ecologicamente sustentável, politicamente democrática e participativa, além de culturalmente plural.
Uma cidade de direitos; uma cidade da igualdade de oportunidades; uma cidade que que seja referência no Semiárido e Nordeste brasileiro de promoção das justiças social e ambiental.
*Roberto Jefferson Normando é graduado em Filosofia, assessor parlamentar, coordenador do Observatório Social do Nordeste e da Frente pelo Direito à Cidade de Campina Grande e membro da Equipe de Coordenação e Assessoria da Escola Diocesana de Fé e Política Dom Manuel Pereira.
**Este é um artigo de opinião e não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato PB.
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Edição: Carolina Ferreira