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Coluna

"Algoz de racistas": a luta continua

Vinicius Júnior, jogador de futebol. - Foto: Reprodução/Redes sociais/Real Madrid BR.
Vinicius Júnior é uma inspiração para que crianças, adultos e idosos lutem por seus direitos

Por Ana Beatriz Silva da Rosa*

O racismo é a discriminação contra um determinado grupo étnico-racial, sua manifestação pode ser por meio de práticas conscientes ou não que ferem a identidade da outra pessoa. As práticas racistas iniciaram-se com a colonização, ao qual os europeus utilizavam teorias eurocêntricas para justificar a superioridade dos brancos em relação aos pretos e aos indígenas. Apesar de anos após a abolição da escravatura e de teorias que determinam a supremacia branca terem sido refutadas, ainda hoje há muitos resquícios de uma época marcada pela desigualdade e preconceito. 

O século XX foi marcado por lutas antirracistas, tendo como principais nomes Nelson Mandela, Malcolm X e Martin Luther King Jr. Eles influenciaram globalmente a perspectiva de onde o negro pode e deve estar na sociedade, mas, por vezes, foram silenciados pela elite branca. Nessa grande resistência, são celebrados e lembrados até os dias de hoje, inspirando a população negra a lutar pelos seus direitos.

Após décadas de lutas contra o racismo, atualmente, ainda há, infelizmente, atos e comportamentos baseados na inferioridade racial. Desde 2021, o brasileiro Vinicius Júnior, jogador de futebol, é alvo de racismo dentro e fora dos campos por torcedores rivais do Real Madrid. A ele são dirigidas ofensas como “mono” (macaco em espanhol), além de terem pendurado pelo pescoço, em uma ponte, um boneco para representar o jogador. Diante desse cenário deplorável, Vini Jr. tornou-se porta-voz pela luta contra o racismo, sendo reconhecido mundialmente. 

Em alguns estados brasileiros, como Rio de Janeiro, Paraíba e Rio Grande do Sul, aprovaram a “Lei Vini Jr.”, que visa combater a discriminação nos campos de futebol, tendo por base a ordem de interrupção de jogo quando tiver algum ato que viole os direitos humanos. Além disso, em junho de 2023, num amistoso entre Brasil e Guiné, disputado em Barcelona, a seleção brasileira entrou com uma camisa de cor preta alusiva à luta contra o racismo, levando aos campos o debate de igualdade racial.

Leia: Promulgada Lei Estadual “Vini Jr” de combate ao racismo nos estádios da PB


Camisa preta da seleção brasileira, em alusão à luta antirracista. / Foto: : Joilson Marconne/CBF/Reprodução

Em 9 de maio de 2023, o Brasil, por meio da ministra da igualdade racial Anielle Franco, e a Espanha, por meio da ministra da igualdade Irene Montero, assinaram um acordo que visa o combate ao racismo e a xenofobia, em especial o combate de discriminação em atividades esportivas. 


Anielle Franco e Irene Montero. / Foto: Rithyele Dantas/MIR.

Apesar desse esforço por parte das federações, o jogador Vini Jr. ainda é vítima de racismo. Em 21 de maio de 2023, ocorreu um jogo entre Real Madrid e Valência e, durante a partida, o jogador ouviu insultos racistas oriundos da arquibancada. A polícia espanhola foi acionada e chegou ao local, mas não expulsou os torcedores da torcida rival. De acordo com o código da FIFA, a partida deveria ser suspensa, mas após oito minutos de bola parada o jogo foi reiniciado. Ainda nesse jogo, Vini foi expulso de campo. Na coletiva, o técnico do Real Madrid, Carlo Ancelotti, condenou essas atitudes. Já nas redes sociais, Vinicius evidenciou que não irá recuar da sua luta contra o racismo, e pediu ações e punições aos agressores. 

: Técnico favorito à seleção sai em defesa de Vini Jr. após estádio inteiro berrar coros racistas :

Esse caso tomou repercussão pelo mundo todo. O presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, veio a público pedir providências à FIFA e à Liga espanhola. O Real Madrid disse que iria acionar a justiça e o Valência afirmou que iria punir os torcedores racistas. Após um ano de investigação, dia 10 de junho de 2024, os três torcedores foram condenados a oito meses de prisão e não podem frequentar jogos nos estádios espanhóis durante o período de dois anos. 

Diante ao exposto, evidencia-se que mesmo sendo uma pessoa de visibilidade mundial e aclamada por ser um excelente jogador de futebol, ainda há muitos que querem silenciá-lo e criticá-lo. No entanto, o fato é que não punir atos de discriminação racial é estar acobertando os racistas e fazendo com que essas atitudes sejam cada vez mais decorrentes. Essa vitória não é apenas de Vinicius Junior, mas sim de toda a sociedade, seja a população negra ou daquela que luta por direitos iguais. Apesar de tardia, a justiça foi feita. 

Mesmo com essa vitória contra o racismo na Espanha, jogadores argentinos comemoraram a taça da Copa América com música racista e transfóbica em relação aos jogadores negros que atuaram pela França na Eurocopa. Em nota, a FIFA repudia qualquer ato de discriminação e diz que o vídeo ao qual mostra os jogadores comemorando de forma racista será alvo de investigação. O jogador, Enzo Fernández, que estava gravando a comemoração ao vivo no Instagram, pediu desculpas na rede social e o Chelsea, seu atual time, irá abrir um processo disciplinar contra ele. 

 Apenas crianças pretas terão figuras semelhantes que brigam contra a desigualdade? E as crianças brancas, os seus ídolos lutam contra o racismo? 

Dessa maneira, vale salientar que a luta contra atos racistas não deve ser apenas das pessoas pretas, mas sim de toda a sociedade. Ressalta-se que jogadores de futebol tem grande influência midiática, o que significa que seus atos e atitudes podem influenciar a sociedade e o modo como as pessoas se relacionam. Assim, esse caso dos jogadores argentinos mostra que a luta contra o racismo deve ser diária. Apenas crianças pretas terão figuras semelhantes que brigam contra a desigualdade? E as crianças brancas, os seus ídolos lutam contra o racismo? 

Hoje, Vinicius Junior, é um defensor de direitos humanos da Organização das Nações Unidas (ONU), e está empenhado em lutar pela igualdade de direitos humanos dentro e fora dos estádios de futebol e combatendo a discriminação racial. Sua luta é traçada junto com o jogador estadunidense de futebol americano Colin Kaepernick. 

O exemplo de Vini Jr. nos permite afirmar que mesmo chegando ao topo de sua carreira, também precisa ser 'o algoz de racistas'. 

Dessa maneira, pode-se afirmar que Vinicius Júnior é uma inspiração para que crianças, adultos e idosos lutem por seus direitos, acreditem em seus sonhos e persistam para que os tornem realidade. Vini Jr. assemelha-se às figuras como Nelson Mandela, Malcolm X e Martin Luther King, pela luta política e antirracista contra os atos de racismo. O exemplo de Vini Jr. nos permite afirmar que mesmo chegando ao topo de sua carreira, também precisa ser “o algoz de racistas”. 

Para não concluir, a luta contra o racismo continua e as indagações permanecem presente: quando um negro com grande visibilidade mundial começa a questionar o sistema, há um medo para que outras pessoas negras lutem pelos seus direitos? Por que quando um negro chega ao topo de sua carreira incomoda a sociedade dominada por brancos? É para continuar a reflexão...

Para saber mais

BOUHAJ, Karima. Una biografia Vinicius Junior. Independently Published. Edição espanhola, 2023.

FILHO, Mario. O negro no futebol brasileiro. Rio de Janeiro: Mauad X, 2010. 

FOER, Franklin. Como o futebol explica o mundo: um olhar inesperado sobre a globalização. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 2005.

*Graduada em pedagogia pela Uninassau, graduanda em terapia ocupacional pela UFPB. É membro do Projeto de Extensão Atenção da Terapia Ocupacional à Criança com Trissomia 21, orientado por Angela Cristina Dornelas da Silva. Participa de projeto de iniciação científica, orientado pelo prof. Gustavo Artur Monzeli. E-mail: [email protected]

**Este é um artigo de opinião e não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato PB.

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Edição: Carolina Ferreira