Paraíba

Coluna

O sangue Potiguara na Baía da Traição

Igreja de São Miguel na Baía da Traição. - Foto: Antony Cruz
Os Potiguara de Baía da Traição sempre lutaram para se manterem vivos e donos de suas terras

Por Antony Marcos Cruz Santana*

A Baía da Traição, situada no litoral norte da Paraíba, é comumente lembrada pelas suas belas praias de mar calmo e de brisa agradável. Diante disso, os habitantes dos municípios vizinhos vão até lá para descansar e festejar nos finais de semanas, feriados e datas comemorativas. O seu Carnaval é bastante agitado e, assim, juntando gente alegre e animada de todos os lugares, os visitantes sempre recordam da Baía, de suas festas e do mar. 

Contudo, esse pequeno município sem aparente importância carrega uma história de resistência e luta dos Potiguara contra a colonização portuguesa. Essas mesmas praias que hoje são conhecidas como pontos turísticos já presenciaram grandes combates e derramamento de sangue de indígenas e europeus que buscavam no Brasil o desejo da conquista e da posse.

No final do século XVI, a coroa portuguesa via os seus domínios no Brasil sendo ameaçados por outras nações europeias e, pensando nisso, intensificou os esforços na colonização, iniciando mais efetivamente a dominação da Paraíba. Entretanto, as terras paraibanas já eram habitadas por vários povos, mas os que mais se destacaram inicialmente foram os Potiguara e os Tabajara, grandes senhores do litoral paraibano. 

A fundação da cidade, hoje nomeada de João Pessoa, carrega uma grande ligação com os Potiguara e a Baía da Traição. Na tentativa de fundar a cidade e de fixar a sua ocupação, os portugueses travaram um intenso combate contra os comedores de camarão, assim chamados na língua Tupi.

Observando o seu território sendo ameaçado, eles não mediram forças em guerrear contra os colonizadores, atrasando em vários anos a fundação de João Pessoa e só sendo isso possível após a aliança com os seus rivais, os Tabajara. O reduto dos Potiguara ao norte foi atacado com uma grande força, visto que para efetivar a conquista do rio Paraíba, era necessário antes desmobilizar as forças francesas e Potiguara encontradas lá. Foi a primeira desolação da Baía da Traição onde as aldeias e as plantações foram destruídas. Todavia, em outros momentos essa ação iria acontecer novamente.

Os Potiguara em todo os períodos do Brasil colonial nunca deixaram de atacar e enfrentar os portugueses que enxergavam os nativos como selvagens e animalescos. No século XVII, surge uma figura importantíssima na esfera nacional, Pedro Poty. Nascido na própria Baía da Traição, aliou-se aos holandeses em busca de melhorar as condições para os indígenas que sofriam com maus tratos, agressões, roubos e eram escravizados pelos portugueses. 

Lutando em diversas batalhas contra eles, Poty buscou vingança de todo o massacre realizado na sua cidade natal pela ajuda que ela ofereceu em uma das primeiras tentativas de conquista realizada pelos holandeses. Infelizmente, Pedro Poty morreu no cárcere dos portugueses, porém nunca deixou de lutar contra os usurpadores de suas terras. Alguns documentos, por exemplo, encontrados no arquivo histórico ultramarino de Lisboa¹ não deixam de citar as constantes sublevações dos indígenas Potiguara que periodicamente se revoltavam e atacavam os soldados da coroa no século XVIII.
 
Na atualidade, continuamos lutando constantemente em busca de melhores condições de vida e pela retomada de nossas terras. No século XX, foi realizada a demarcação do território, um problema que desde o século XIX urgia por uma solução e constantemente os nossos direitos de posse acabavam por serem violados por personagens e figuras de destaque como políticos e grandes industriais. 

Enfim, em todos os períodos do Brasil, os Potiguara de Baía da Traição sempre lutaram para se manterem vivos e donos de suas terras, seja contra a escravidão, a usurpação de seu território ou por melhores condições de vida. Entre os Potiguara existe um ditado que resume toda a luta e resistência: “A gente nasce, a gente vive, a gente morre, mas o nosso povo viverá nesta terra para sempre.” 

Notas 

¹ 
Projeto Resgate. Consulta do conselho ultramarino, ao rei D. João V, sobre a carta do capitão-mor da Paraíba, Pedro Monteiro de Macedo, informando a prisão dos principais cabeças da sublevação dos índios da aldeia de Baía da Traição, além de incitar os negros a matarem seus senhores. Disponível aqui.

*Antony Marcos Cruz Santana é indígena Potiguara da aldeia Coqueirinho do Norte. Atualmente, faz licenciatura no curso de história na Universidade Federal da Paraíba (UFPB) e tem trabalhado buscando promover a cultura e o ensino da história indígena Potiguara. Instagram: @antonycruzst.

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Edição: Carolina Ferreira