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Criadora da agência de checagem nordestina Coar, Marta Alencar, defende união entre agências de fact-checking contra desinformação nas plataformas digitais

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Marta Alencar, criadora da agência de checagem nordestina Coar. - Arquivo Pessoal
A partir do momento que fizermos estas parcerias [...]o combate à desinformação será mais eficaz

Por Mabel Dias*

 

O CEO da empresa de tecnologia Meta, Mark Zuckerberg, anunciou mudanças na política de moderação de conteúdo no Instagram, Facebook, WhatsApp e Threads, acabando com o programa de checagem de informações falsas, o que acendeu um novo alerta de pesquisadoras/es e coletivos que atuam no combate à desinformação e ao discurso de ódio no Brasil. O programa de checagem da Meta já não era muito eficaz, e agora, com as mudanças políticas anunciadas por Zuckerberg, a circulação de conteúdo desinformativo, sem checagem de agências especializadas em fact- checking, fica ainda mais difícil de ser feita e divulgada.

A decisão da Meta está alinhada às diretrizes políticas da extrema direita, em particular a norte americana, capitaneada pelo presidente eleito nas eleições de 2024, Donald Trump e torna ainda mais nocivo o ambiente digital para públicos vulnerabilizados, como mulheres, LGBTQIAP+, negras e negros, imigrantes e indígenas. São nestas plataformas que centenas de grupos masculinistas estão presentes, propagando desinformação e discursos misóginos, racistas e LGBTfóbicos. Para completar este quadro desolador, relatório do Fórum Econômico Mundial, relativo a 2024, identificou que a desinformação está no topo dos riscos globais para a humanidade.


Oficinas de Checagem da Coar em escolas estaduais da Paraiba. / Divulgação

Para debater estas questões e pensar medidas a serem tomadas para combater os problemas que devem se agravar nas plataformas digitais, após a decisão da empresa multibilionária Meta, conversamos com a professora substituta da Universidade Federal do Piauí e criadora da primeira agência de checagem de fatos independente do Nordeste – a Coar, Marta Alencar.

Confira a entrevista:

Mabel Dias - O que representam estas mudanças anunciadas por Mark Zuckerberg nas plataformas da Meta?

Marta Alencar - Essas mudanças da Meta em não ter mais esse vínculo com checadores e de permitir que a comunidade comente, a comunidade analisa, propõe conteúdos, acaba de certa maneira, contribuindo para o aumento de ódio e também para o aumento de conteúdo desinformativo. Isso me preocupa com a qualidade da informação que circula nesse ambiente digital, e de certa maneira, impacta pessoas que não sabem discernir o que é mentira ou não, e vão estar mais vulneráveis ao discurso de ódio. Vejo isso como um risco à democracia e que vai impactar os direitos humanos, é um retrocesso. A Meta, por muito tempo, apoiou programas de financiamento de incentivo ao jornalismo, principalmente o jornalismo voltado ao fact checking, então eu vejo esta atitude como um imenso retrocesso.

Essas mudanças podem prejudicar as eleições de 2026 no Brasil? De que forma?

Com certeza haverá impactos significativos. Notamos que haverá um fortalecimento da extrema direita, e isso é extremamente prejudicial porque a extrema direita é que mais informa no Brasil e com todo esse poder, tanto da plataforma X (ex-Twitter), como da Meta, apoiado por Mark Zuckerbeg, apoiando o governo Trump, que apoia Bolsonaro no Brasil, haverá mais ataques à democracia, mais conteúdos desinformativos, e vejo isso com muita preocupação, principalmente em relação as minorias. Haverá também discursos sobre o desmatamento, ataques aos nordestinos, e eu acredito que a desinformação circulará de forma mais impactante nas eleições em 2026.

Sabemos que divulgação das checagens de conteúdo nestas plataformas já era precária e que é não é muito simples fazer o trabalho de checagem. Com esta retirada de apoio da Meta às agencias de checagem, quais problemas podem surgir?

Haverá maior viralização de conteúdo desinformativo, as pessoas não vão saber distinguir o que é notícia, o que é opinião, o que é verdade, o que é mentira, e isso é muito preocupante. Porque esses fact checkers, por mais que o discurso do Mark Zuckerberg diga que os fact checkers agiam com um posicionamento político, a fala dele é contraditória, maldosa, ele põe em cheque nosso trabalho, porque nós checamos as informações, principalmente os conteúdos virais, por mais que não seja em tempo real, mas exerce um papel extremamente importante. O Aos Fatos e a Lupa fizeram checagem em tempo real durante as eleições de 2024 e esse tipo de trabalho não vai mais ser repercutido nas redes sociais como antes, impactando, principalmente, as pessoas que não irão ter o poder de argumentação ou de compreensão se realmente um conteúdo que está circulando na internet, nas redes, se é verdadeiro ou não. E isso, ressalto, é muito perigoso, porque as pessoas ficarão a mercê a mais conteúdos desinformativos e práticas antidemocráticas.

Como as agências de checagem devem agir daqui por diante, quais são as soluções devem ser tomadas para enfrentar os problemas que já existem nas plataformas e que vão piorar depois destas medidas da Meta?

As iniciativas de checagem devem se manter mais unidas, mais abertas a diálogos, essa união, que é proposta pela própria Rede Nacional de Combate à Desinformação e essa parceria entre as iniciativas é um importante pontapé para combater as atitudes das plataformas, do Elon Musk, do X, como também, do Mark Zuckerberg, com a Meta. A partir do momento que fizermos estas parcerias, colaborações, e estarmos de fato, juntos, o combate à desinformação será mais eficaz. Essas big techs agem de maneira autoritária, porque há interesses econômicos por trás de tudo isso, o que é abordado pela Economia Política da Desinformação, eles estão mais interessados no lucro, e não na informação de qualidade, fazendo com que as pessoas fiquem a mercê da corrupção, de práticas antidemocráticas e do discurso de ódio.

 

*Mabel Dias é jornalista, mestra em Comunicação pela UFPB, feminista, observadora credenciada do Observatório Paraibano de Jornalismo, integrante do Coletivo Intervozes, doutoranda em Comunicação pela UFPE e autora do livro “A desinformação e a violação aos direitos humanos das mulheres: um estudo de caso do programa Alerta Nacional”, da editora Arribaçã, e coleção Anayde Beiriz.

**Este é um artigo de opinião e não necessariamente representa a linha editorial do Brasil do Fato Paraíba.

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Edição: Heloisa de Sousa