DIGNIDADE

Câmara do DF debate políticas públicas de educação, saúde e empregabilidade para pessoas trans

Deputado propõe cotas para pessoas trans em empresas contratadas pelo governo distrital

Brasil de Fato | Brasília (DF) |
Audiência pública para discutir políticas afirmativas para população trans no DF aconteceu nesta quarta (5) na CLDF - Foto: Agência CLDF

Em 2024, a Universidade de Brasília (UnB) aprovou a criação de cotas trans para ingresso na graduação, mas detalhes da implementação dessa política afirmativa, como a composição das comissões de heteroidentificação e as políticas de permanência, ainda estão em aberto. O tema foi discutido em audiência pública na Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF), nesta quarta-feira (5), que abordou três principais reivindicações da população trans: educação, saúde e empregabilidade.  

“É muito comum que as pessoas trans não consigam auxílio permanência e, assim, não consigam ficar na universidade depois de entrar. Porque essa particularidade da violência que é imposta a nós não é vista pelo Estado como algo digno de assistência por parte dos órgãos. Então, acima de entrar na universidade, a gente quer permanecer. A gente não quer só mais sobreviver, a gente quer viver e mostrar a nossa potência dentro desse ambiente”, destacou Kaleb Giulia, coordenador do Instituto Brasileiro de Transmasculinidades (Ibrat) no DF. 

A reunião, presidida pelo deputado distrital Fábio Felix (Psol-DF), contou com a participação de coletivos trans e autoridades. O objetivo do encontro foi discutir políticas públicas afirmativas para a população trans no DF. 

“Estamos falando ainda do direito à vida, à dignidade. Quando a gente começa a conseguir elaborar sobre cotas e possibilidade de inserção no ensino superior e na empregabilidade, trazemos um respiro de oportunidade. Sabemos que ainda está muito aquém, com muitas dificuldades. É um debate que tentam interditar e impedir, mas não podemos deixar de fazer”, afirmou Felix. 


Rozana Naves, reitora da UnB, ao lado do distrital Fábio Felix / Foto: Agência CLDF

A reitora da UnB, Rozana Naves, participou da audiência e pediu colaboração dos movimentos e associações trans presentes para compor a comissão que tratará das cotas. A expectativa é que a reserva 2% das vagas para pessoas trans entre em vigor no vestibular de agosto de 2025, para ingresso no primeiro semestre de 2026. 

“Precisamos mesmo desarquivar essas pautas, elas têm que estar em discussão, na mídia, nos parlamentos e na sociedade de maneira geral. E nós reconhecemos que a universidade tem um papel fundamental para levar essas pautas adiante, desarquivá-las e tornar visíveis à comunidade”, afirmou a reitora. 

Felix destacou ainda que há um projeto de lei em tramitação na CLDF para que a Universidade do Distrito Federal (UnDF) também tenha cotas trans em seus processos de seleção.

Saúde 

O acesso à saúde para a população trans também foi um dos desafios debatidos na audiência pública desta quarta (5). Participantes cobraram mais investimentos e profissionais para o Ambulatório Trans do DF. Como encaminhamento da reunião, Fábio Felix anunciou a realização de uma reunião com a Secretaria de Saúde do DF (SES-DF) para discutir o acesso à terapia hormonal e à cirurgia de redesignação sexual no sistema público. 

Outro aspecto destacado foi a saúde mental das pessoas trans. Kaleb Giulia evidenciou que as transmasculinidades são especialmente afetadas por essa questão. Segundo ele, estudos indicam que 85% dessas pessoas já pensaram em cometer suicídio. 

“É uma população que enfrenta graves exclusões do sistema público de saúde mental e isso agrava extremamente o acesso à escolaridade”, afirmou o coordenador do Ibrat, destacando os altos índices de evasão escolar entre pessoas trans.


Kaleb Giulia, coordenador do Ibrat no CLDF, falou a respeito dos principais desafios para as transmasculinidades / Foto: Reprodução/YouTube/CLDF

Uma pesquisa realizada pelo Ibrat com 406 pessoas transmasculinas em 2022 elencou as principais violências institucionais sofridas por essa população no contexto educacional. Mais da metade dos participantes (51,5%) relataram que já tiveram o direito ao uso de nome social desrespeitado, 164 (40,4%) afirmam ter sofrido violências em relação ao uso de banheiros; 141 (34,7%) já sofreram violências em relação com docentes e 101 (24,9%) em relação a conteúdos didático.

Empregabilidade

Segundo um levantamento divulgado pelo Fórum de Empresas e Direitos LGBTI+ e a plataforma To.gather em maio de 2024, apenas 0,38% dos postos de trabalho formais no país são ocupados por pessoas trans. O estudo revelou ainda que grande parte da população trans ocupa cargos de baixa remuneração ou posições que não correspondem às suas qualificações.

A questão também é um grande desafio no DF. “Nós não queremos as mulheres trans dependentes de auxílio do governo. Nós queremos qualificá-las em alguma área para entrar no mercado de trabalho”, afirmou Letícia Pires da Silva, do coletivo Força Trans, durante a audiência pública.


Audiência discutiu cotas trans em empresas contratadas pelo GDF / Foto: Agência CLDF

O deputado Fábio Felix propôs a criação de um banco de currículos voltado especificamente para pessoas trans. Além disso, o parlamentar apontou que está em tramitação na CLDF um projeto de lei que cria cotas para contratação de pessoas trans nas empresas que prestam serviços ao Governo do DF (GDF). “Nós precisamos nos mobilizar para que esse projeto seja aprovado”, destacou.

Felix também afirmou que tem sido feito tratativas com a Companhia de Desenvolvimento Habitacional do DF (Codhab) para que as pessoas trans sejam consideradas dentro dos critérios de vulnerabilidade nas políticas de moradia.

“Temos vivido um momento muito difícil, porque dentro da comunidade LGBT o segmento mais atacado tem sido a população trans. Ela tem sido utilizada como um bode expiatório para desqualificar todo o debate em gênero e sexualidade. O objetivo é retirar direitos e retirar a gente do espaço público. Especialmente a população trans, mas isso afeta toda a comunidade LGBT, afeta os direitos das mulheres, afeta muitos segmentos da sociedade. Querem voltar a gente para um gueto que temos lutado historicamente para sair”, defendeu o parlamentar.

Fonte: BdF Distrito Federal

Edição: Flávia Quirino