O mês de janeiro foi marcado por tentativas de apagamento da memória de dois mártires da luta contra o latifúndio e contra a destruição da floresta na Amazônia.
Em Anapu (PA), município onde Irmã Dorothy foi executada, uma pintura em tributo à missionária norte-americana foi escondida por um pano em uma paróquia. Dias antes, as mãos da estátua de Chico Mendes na Praça Povos da Floresta, no centro de Rio Branco, foram arrancadas. A estátua do líder seringueiro acumula episódios de violência e vandalismo.
Os crimes foram denunciados pela filha do ambientalista Angela Mendes, presidente do Comitê Chico Mendes, em entrevista ao Brasil de Fato durante a Jornada de Agroecologia da Bahia. O evento foi organizado pela Teia dos Povos e ocorreu entre os dias 29 de janeiro e 2 de fevereiro, com representantes de movimentos populares e de povos e comunidades tradicionais de todo Brasil.
"Mesmo a gente estando em um governo de esquerda, o agronegócio ainda manda. O agronegócio, as mineradoras… E eles mandam também recados. Esse apagamento da imagem, da história do meu pai e da irmã Dorothy faz parte desse projeto também, para dizer que a luta deles é em vão. Mas eu não acredito nisso. A gente faz um trabalho muito focado no fortalecimento dessa memória. A nossa luta é contra esse sistema que nos violenta e que degrada de uma forma tão forte", pontua a filha de Chico Mendes.
Mãos de estátua de Chico Mendes foram arrancadas de monumento no centro de Rio Branco (AC) / Jardel Angelim/Rede Amazônica
Violência em Anapu (PA)
Na obra escondida em Anapu (PA), irmã Dorothy aparece ao lado de padre Josimo Tavares, também assassinado em 1986 no Maranhão, após sofrer ameaças de fazendeiros. Os dois ex-integrantes da Comissão Pastoral da Terra (CPT) estão ao lado de Jesus, sobre troncos de árvores cortadas.
A pintura foi feita quatro anos após a execução da freira em 12 de fevereiro de 2005, um crime com ampla repercussão internacional.
Segundo o padre responsável pelo espaço religioso, a decisão de esconder a obra não tem motivação política, o que é negado por amigos e militantes de movimentos populares escutados pela Repórter Brasil, que trouxe o caso à tona.
Igreja em Anapu(PA) antes de obra ser escondida / Divulgação/Redes Sociais
De acordo com a CPT, desde o assassinato de Dorothy, outras 21 pessoas foram executadas por questões ligadas à terra em Anapu (PA).
A cidade é uma das mais violentas da região em termos de conflitos fundiários, ocupando o 13° lugar no ranking de mortes violentas intencionais nas cidades da Amazônia Legal, de acordo com dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.
"Enquanto a gente estiver aqui, enquanto os companheiros, enquanto a memória do Chico, enquanto a memória da Irmã Dorothy, do Zé Cláudio da Maria do Espírito Santo, do Dom Philips e do Bruno, do Paulino Guajajara, de Ari Uru-Eu-Wau-Wau, enquanto todas essas forças estiverem na memória, a gente vai continuar aqui lutando por elas. Nós vamos continuar incomodando. É a mesma luta, a gente tá aqui pra continuar essa luta e dizer que não são eles que vão nos dizer e que vão nos intimidar com esse tipo de coisa", afirma Angela Mendes.
Edição: Nathallia Fonseca
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